sexta-feira, 23 de dezembro de 2011

Natal cósmico e pessoal

No princípio havia a Palavra, soberanamente capaz
de sujeitar e de modelar toda Matéria que nascia.
No princípio não havia frio e trevas; havia o Fogo.
É a luz preexistente que, paciente e infalivelmente,
elimina nossas sombras.
Vós, Espírito ardente, Fogo fundamental e pessoal.
Aconteceu: o Fogo, mais uma vez, penetrou a Terra.
Não caiu ruidosamente sobre os cimos, como o raio em seu esplendor.
O Senhor forçaria as portas para entrar em sua própria casa?
Sem tremor, sem trovão, a chama iluminou tudo por dentro.
Desde o coração de menor átomo até a energia das leis mais universais.
Naturalmente invadiu, individualmente e em seu conjunto,
cada elemento, cada força, cada ligação do nosso Cosmo.
E este, espontaneamente, se inflamou.
Toda a matéria doravante está encarnada, meu Deus,
pela vossa Encarnação.
(Teillard de Chardin)

Feliz Natal!
Afonso Murad

segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

Governo destrói um dos mais belos projetos socioambientais do Brasil

Eliane Brum

Parte do Brasil conheceu o semiárido pela imprensa, nas constantes denúncias de corrupção e desvio de verbas públicas em obras que deveriam combater a seca, mas estagnavam nas mãos privadas de coronéis. Nos últimos anos, porém, a paisagem do sertão estava mudando, graças a um movimento iniciado em 2003. No primeiro ano do governo Lula, a ASA (Articulação no Semiárido Brasileiro), uma rede que reúne centenas de organizações não governamentais, procurou o presidente para propor uma parceria para a construção de cisternas de alvenaria no sertão nordestino. Seus interlocutores eram Frei Betto e Oded Grajew, então no governo. Lula acolheu a ideia.

O resultado deste esforço entre governo federal e sociedade civil organizada foram 371 mil cisternas de cimento, envolvendo 12 mil pedreiros e pedreiras das comunidades e beneficiando mais de 2 milhões de brasileiros em 1.076 municípios. Algo grande, muito grande, para quem acompanha a história do Nordeste brasileiro. Basta andar pelo semiárido para ver que, quando há vontade política, é possível fazer milagres de gente. A presença da água, com a implantação coletiva de uma simples cisterna, tem mudado não apenas a economia, mas a autoestima do povo que vê florescer a vida e também a possibilidade de reescrever sua história – desta vez como autor, e não mais como personagem.

Tudo ia muito bem até este mês de dezembro, quando a coordenação da ASA foi informada pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome (MDS) que suspenderia o pagamento dos recursos para o “Programa Um Milhão de Cisternas”. O rompimento da parceria com a ASA é anunciado no momento em que a opinião pública está predisposta a considerar qualquer ONG fraudulenta. Esquece-se – talvez por conveniência – que o surgimento das ONGs é resultado direto da redemocratização do país. E também que uma parcela significativa delas não apenas é honesta, como tem operado uma grande transformação nas relações e nos resultados em várias áreas cruciais.

Pela seriedade e competência da sua atuação, a rede ASA (Articulação do Semi-árido) já recebeu uma dezena de prêmios. Entre eles, um prêmio da ONU, que a considerou “uma referência de gestão e inclusão social no campo do acesso à água e do direito à segurança alimentar e nutricional das famílias carentes do semiárido”. Por que o governo decidiu suspender a parceria com a ASA?

A ASA atua usando o conhecimento da comunidade e estimulando que as pessoas se apropriem coletivamente do processo de construção de cada cisterna. É a comunidade que decide em conjunto quem vai receber a cisterna primeiro, a partir de critérios como pobreza, número de crianças e de idosos, se a mulher é a chefe de família etc. Cada família participa da construção da cisterna, que dura cerca de cinco ou seis dias, e fornece a água para a vizinha enquanto não chegar a vez dela. Para a construção é usada a mão de obra da cidade ou povoado e o material das lojas dos pequenos comerciantes, movimentando a economia local. É também a agricultura produzida em cada região que fornece a alimentação. Para a ASA, a implantação de uma cisterna é mais do que uma obra: é a construção de um espaço social de onde tem emergido novas lideranças e uma juventude ativa. Mudança socioeconômica e política importante em uma região historicamente dominada por oligarquias em que sempre coube aos sertanejos ou se submeter a algum “painho” – ainda que com pinta de moderno – ou migrar para o centro-sul. “A água estava concentrada na mão de poucos. Com as cisternas, a água foi repartida.”

Na tecnologia social da ASA, a implantação das cisternas não é vista como favor do governo, mas como direito. Não é assistencialismo, mas política pública. As pessoas são estimuladas a exercer a cidadania e a tomar suas próprias decisões, coletivamente – tornando o voto de cabresto cada vez mais difícil. Bem diferente, portanto, de um modelo assistencialista/populista que forma gerações de eleitores agradecidos a um pai ou mãe magnânimos. Seria isso que estaria incomodando o governo federal e seu amplo e heterogêneo espectro de aliados às vésperas das eleições municipais de 2012? Espero – sinceramente – que não.

No mesmo período em que a ASA foi informada de que não receberia os recursos para os próximos meses, o Ministério da Integração Nacional anunciou e comemorou a instalação da primeira de 300 mil cisternas de polietileno, em meio a campanhas de protesto das comunidades do semiárido que rejeitam o equipamento de plástico. O governo alega que as cisternas de polietileno podem ser produzidas em grande escala e assim atingir um número maior de famílias com mais rapidez. Segundo o governo, não se trata de substituição de uma tecnologia por outra, mas de complementação.

A ASA apresenta argumentos convincentes para condenar as cisternas de plástico. “Elas custam mais do que o dobro do valor das cisternas de alvenaria. Enquanto a nossa custa R$ 2.080, a de plástico custa R$ 5.000. Ou seja: se fosse só o dobro, com o mesmo valor as empresas fazem 300 de plástico – e nós construiríamos 600”, diz Naidison Baptista, coordenador da ASA. Pelos cálculos da ASA, para cada 10 mil cisternas de alvenaria instaladas, há uma injeção de R$ 20 milhões na economia local. Com as de plástico, a maior parte dos recursos públicos ficará nas mãos dos empresários. Na mesma lógica, a população se tornará para sempre dependente das empresas para a manutenção e a reposição, já que não dominará a técnica. Quando existe qualquer problema com as cisternas de alvenaria, o pedreiro da comunidade resolve de forma simples.
“Em vez de construir, as pessoas vão receber as cisternas de presente. Das mãos de quem? É o que vamos ver. E a gente sabe que, como simples beneficiárias, do meio para o fim do processo as famílias não cuidam mais. Temos vários exemplos de cisternas que foram entregues prontas e que hoje não funcionam mais porque as comunidades não se envolveram em sua construção, não tem o sentido do pertencimento”, diz o coordenador da rede. “É a volta da indústria da seca, com grandes obras nas quais a população fica à margem, e o dinheiro na mão de grupos.”

É possível ter uma ideia de quem vai ganhar com a mudança. Mas, por quê? Por que um trabalho que funcionava tão bem, a ponto de ser elogiado e premiado pelo governo federal, está sendo descartado pelo governo federal? Se funciona bem, por que mudar? Seria porque funciona bem demais? Espero, sinceramente, que não. (....)

Chego ao fim deste ano perplexa. Cresci ouvindo que o Brasil era o país do futuro, mas não podia acreditar porque passei a infância e a adolescência numa ditadura que torturava gente como a então jovem Dilma Rousseff. Participei dos comícios das “Diretas Já” e cobri como jornalista as primeiras eleições da redemocratização. Muito mais tarde, testemunhei e escrevi sobre a eleição de Lula e o comício da vitória, em 2002. Nos últimos anos, já madura, ouço que o futuro chegou. E estava começando a acreditar, pelo menos em alguns aspectos. E não é que agora, às vésperas de 2012, anunciam com eufemismos que podemos estar voltando ao passado também no sertão nordestino? Não há de ser por saudades da literatura de Graciliano Ramos e de João Cabral de Melo Neto, porque esta é a única que com certeza não voltará.

Texto resumido. Para ler tudo:
http://revistaepoca.globo.com/Sociedade/eliane-brum/noticia/2011/12/presente-de-dilma-azeda-o-natal-no-semiarido.html

terça-feira, 13 de dezembro de 2011

Resultados da COP-17

A COP-17, a conferência do clima de Durban, África do Sul terminou lançando a base para um futuro acordo contra o aquecimento global que, pela primeira vez, envolverá metas obrigatórias para todos os países do mundo - mas só após 2020. É o maior avanço político na luta contra os gases-estufa desde a gênese do Protocolo de Kyoto, em 1995. Mas, até o fim desta década, nenhuma medida internacional efetiva contra o aquecimento global virá. Poluidores ficam livres para manter compromissos fracos que já haviam adotado na conferência de Copenhague, em 2009, e que põem o mundo no rumo de um aquecimento de até 4°C em 2100.


O texto de uma página e meia, batizado de "Plataforma de Durban" e aprovado já na manhã de domingo, estabelece um calendário para criar "um protocolo, outro instrumento legal ou um resultado acordado com força legal" em 2015, que possa entrar em vigor até 2020. Trata-se de algo inédito na Convenção do Clima da ONU, pois pela primeira vez os maiores poluidores do mundo, EUA e China, integrarão o mesmo acordo.

Nas palavras do negociador-chefe americano, Todd Stern, a Plataforma de Durban "desbasta a barreira que existia entre países desenvolvidos e países em desenvolvimento" na convenção. Foi essa divisão que impediu que o Senado americano ratificasse Kyoto e que causou, em 2009, o impasse com a China que fez fracassar a conferência de Copenhague.A conferência também aprovou a prorrogação do acordo de Kyoto, mas sem três de seus principais membros: Rússia, Canadá e Japão.

Por fim, foi lançado o chamado Fundo Verde do Clima, que tem a promessa de US$ 100 bilhões anuais a partir de 2020 para combater emissões e promover ações de adaptação à mudança climática nos países em desenvolvimento. "As decisões que vocês tomaram aqui são verdadeiramente históricas", disse aos delegados a presidente da COP, a chanceler sul-africana Maite Mashabane.
Durban testemunhou outros ineditismos: foi a COP mais longa da história, a primeira que terminou com seus principais atores (EUA, emergentes e União Europeia) tentando levar crédito pelo sucesso em vez de culpar uns aos outros pelo fracasso. Foi também a primeira conferência a ter suas decisões referendadas por negociadores reunidos numa "indaba", nome de uma assembleia tradicional africana em que chefes de vilas se juntam para resolver problemas.

O acordo, porém, vinha sendo gestado havia meses entre os países do grupo Basic (Brasil, China, Índia e África do Sul), a União Europeia e os Estados Unidos, e costurado durante vários dias em reuniões secretas no hotel Hilton, anexo ao ICC, o centro de convenções da COP. Nesses encontros, o Brasil desempenhou um papel importante de mediador, ajudando a encontrar a linguagem no texto que permitisse aos EUA aderirem a um acordo legalmente vinculante (como a União Europeia exigia) e ao mesmo tempo evitassem a rejeição do Senado.
Fonte: jornalista Cláudio Angelo, Folha de S. Paulo, 12 dez 2011.

Felizmente, A COP 17 não foi o fracasso anunciado. Alguns passos foram dados. Mas, deixou uma série de questões em aberto. O fato de Rússia, Canadá e Japão não assumirem a continuidade do protocolo de Kioto, até que o seu substituto seja tecido, aprovado e entre em vigor, compromete a possibilidade de deter o avanço da concentração dos gases de efeito estufa. Imaginar que um novo protocolo, mais exigente em termos de governança planetária, somente entrará em vigor em 2020 dá tristeza! Os grandes chefes das nações, e o poder econômico que os apóia, ainda não tomaram consciência da urgência e decisividade da questão ambiental.

sábado, 10 de dezembro de 2011

ECOJUSTIÇA E MUDANÇAS CLIMÁTICAS

Durante duas semanas, jovens cristãos de 20 países participam de treinamento sobre Eco-Justiça, em Durban, África do Sul, durante a 17ª Conferência das Partes da Convenção-Quadro Nações Unidas para a Mudança do Clima (CQNUMC). O programa é coordenado pelo Conselho Mundial de Igrejas (CMI) em conjunto com a Federação Luterana Mundial (FLM).

Veja o testemunho de Raquel Kleber, publicado pela Agência Latino-Americana e Caribenha de Comunicação (ALC) em 09-12-2011.

Como integrante desse grupo, sinto-me privilegiada por poder vivenciar a troca de experiências com jovens de diversas realidades, através da discussão de questões socioambientais. Além de treinamentos e palestras sobre Economia, Teologia e o conceito e aplicabilidade de Justiça, estamos desenvolvendo projetos que serão posteriormente implementados nos nossos países, conectando, desta forma, as esferas internacional, nacional e local.
O projeto que pretendo desenvolver visa conectar as discussões levantadas nesse treinamento sobre Eco-Justiça, e aplicá-las no contexto brasileiro, através da capacitação de jovens luteranos, para que atuem como lideres em suas comunidades na promoção de justiça sócio ambiental.

O projeto estará relacionado com o já existente programa Criatitude, desenvolvido pelo Conselho Nacional de Juventude Evangélica, da Igreja Evangélica de Confissão Luterana no Brasil (IECLB), em parceria com a Fundação Luterana de Diaconia (FLD), contando com a participação dos jovens nas atividades ecumênicas da Conferência dos Povos na Convenção das Nações Unidas para o Desenvolvimento Sustentável - Rio +20, que será realizada no Rio de Janeiro, em 2012.
Os 28 jovens estão tendo também a oportunidade de participar das atividades da COP17, que, devido às expectativas negativas para o comprometimento dos países para um novo compromisso de redução das emissões de gases de efeito estufa, principais causadores das mudança do clima, tem mobilizado a sociedade civil que, por sua vez, demanda uma ação rápida e efetiva por parte dos governos.
Uma dessas ações foi o chamado Global Day of Action, uma marcha que se tornou tradição nas Conferências das Partes da CQNUMC. Mobilizando cerca de 20 mil pessoas, a demonstração teve o objetivo de chamar a atenção dos governos para a urgência de se tomar uma atitude com relação à mudança do clima, exigindo que eles alcancem um acordo.
O grupo Youth for Eco-Justice teve participação ativa na demonstração, levando um banner dizendo “Polluters Pay” (poluidores pagam), exigindo que os países que mais emitem gases de efeito estufa assumam a responsabilidade e o débito ambiental pela emissão que expelem na atmosfera.

Além disso, os jovens estiveram envolvidos em diversas atividades ecumênicas, como o Rally, encontro ecumênico prévio à COP17. Esse encontro contou com a participação da Secretaria Geral da UNFCC, Cristina Figueres, e com Desmond Tutu, ativista e bispo sul-africano.
Os jovens visitaram também uma comunidade local de Durban, chamada Clermont. Lá conhecemos a Associação Jovem, que tem como foco a busca por soluções para o problema do lixo na sua província.
Jovens foram treinados para trabalhar com o meio ambiente através do Conselho de Diaconia de Durban, o que os habilitou para implementar melhorias ambientais no local. O projeto tem uma forte ligação com a prefeitura, que remunera esses jovens para que realizem o trabalho de limpeza e de manutenção.
O projeto é uma forma de desenvolvimento sustentável, pois engaja jovens da região para cuidarem do ambiente onde vivem, de forma remunerada, e ainda com fundos adicionais através da reciclagem de materiais. O Conselho de Diaconia de Durban tem um papel crucial, ao educar e capacitar tais jovens para atuarem de modo condizente aos desafios locais.

A mudança climática, que vem sofrendo os impactos das ações insustentáveis da humanidade, é também um sinal de injustiça, pois são os setores menos favorecidos que enfrentam as maiores conseqüências. A fim de resolver esse problema, uma mudança no sistema econômico é essencial, mas também uma mudança nas ações humanas a partir da posição de dominadores para mordomos da criação de Deus.
No processo de criação de um mundo ecologicamente mais justo, a juventude tem um papel significativo a desempenhar, pois são os que têm esperança e energia para alterar essas situações, somadas à capacidade de netoworking e habilidade em tecnologia. Nós somos aqueles que serão afetados pela decisão de hoje com a oportunidade única em mãos de apresentar soluções para esse mundo e aplica-las.

sexta-feira, 9 de dezembro de 2011

Agrotóxicos nos alimentos

Recente pesquisa da ANVISA mostrou que grande parte do nosso alimento está contaminado por agrotóxicos. Veja o quadro abaixo, publicado na Folha de São Paulo. O percentual significa a proporção de veneno além do permitido pela lei, nas amostras coletadas em quase todos os cantos do país.

quarta-feira, 7 de dezembro de 2011

Lobby do agronegócio na aprovação do código florestal

Grandes doadores eleitorais do agronegócio que terão multas ambientais suspensas com a aprovação do Código Florestal injetaram cerca de R$ 15 milhões na campanha de 50 congressistas que participaram da votação da norma. É o que revela cruzamento de autos de infração do Ibama com as doações eleitorais. As contribuições foram feitas no pleito de 2010, quando a reforma do código já estava em andamento em comissão especial da Câmara. O valor é 42% maior do que o total doado pelas mesmas empresas na eleição anterior (2006).

As empresas foram autuadas, num total de R$ 1,6 milhão, por irregularidades como destruir vegetação nativa, áreas de preservação permanente, e consumir carvão de mata nativa. Há ainda multas impostas pela Justiça.
Com a nova lei, ao aderir a um programa de regularização ambiental, a empresa terá suas multas suspensas e convertidas em serviços de recuperação ambiental.

Fonte: Lúcio Vaz, Folha de São Paulo, 7/12/11.

quinta-feira, 1 de dezembro de 2011

Interpretaçóes sobre Belo Monte

Todo mundo está confuso, abarrotado de informações suspeitas, sem saber em que confiar, quando se fala em Belo Monte. Resolvi dar uma humilde contribuição sobre alguns pontos que, me parece, causam mais dúvidas.
Vou começar revelando uma coisa que você provavelmente já percebeu: o motivo pelo qual ninguém sabe quem está falando a verdade é que ambos os lados dessa peleja contam verdades incompletas.Dificilmente um ambientalista dirá que o motivo pelo qual Belo Monte só vai produzir um terço da sua capacidade instalada, em média, é que a usina foi reprojetada para operar como fio d’água, o que permitiu diminuir drasticamente o reservatório e… voilà! Menor impacto ambiental.Mas o outro lado não te conta que os engenheiros não fizeram isso porque têm a floresta no coração, mas porque o projeto anterior era tão absurdo que esse foi o único jeito de destravar o processo, embargado pelo STF desde 2002. E que a teimosia de manter os planos mesmo com essa enorme perda de eficiência (sim, nenhuma usina opera no total de sua capacidade o tempo todo, mas a discrepância de Belo Monte é acintosa) revela duas possibilidades:1- A principal motivação para essa usina não é tanto o suprimento energético nacional quanto a necessidade de fazer girar a manivela dos favores e benefícios escusos da política municipal, estadual e federal. E/OU 2- O projeto atual é um drible no licenciamento ambiental, quando o verdadeiro plano seria construir outras hidrelétricas na bacia do Xingu. Portanto, um acúmulo de reservatórios que permitiria a Belo Monte operar com muito mais eficiência. E daí o impacto ambiental será muito, mas muito maior.

“Uma Pergunta!” diz Ingrid Guimarães. “Qual é a solução para a questão energética no Brasil?”, complementa Marcos Palmeira, ambos no vídeo Gota d’Água. E eis que surge a grande besteira da campanha: dizer que as alternativas são energia solar e eólica. Ambas são fontes intermitentes. O sol se põe, o vento para de soprar. Com a tecnologia atual, o papel que essas fontes podem desempenhar é de complementaridade. A espinha dorsal da matriz elétrica brasileira é hidrelétrica e continuará sendo assim.A pergunta que se deve fazer é: precisa construir mais 77 usinas hidrelétricas na Amazônia, entre elas Belo Monte? As opiniões técnicas mais engajadas já cansaram de apontar a importância de medidas de eficiência, como ampliar a potência de usinas já existentes, e combater o desperdício da energia que se perde no caminho da distribuição, em níveis alarmantes. Mas isso nunca tem destaque –ou às vezes sequer aparece – na política pública. Por quê? Aquilo que não é grande obra não interessa?

E ainda que a gente fizesse tudo certinho, desse um tremendo gás no quesito eficiência, botasse freio nas indústrias eletrointensivas e revertesse o quadro de primarização da economia brasileira, ainda assim, daria para não construir mais nenhuma hidrelétrica e continuar crescendo? Não sei. E acho que ninguém sabe. Isso porque o planejamento energético nacional padece de falta de transparência. Ouço essa crítica há anos, tanto das ONGs quanto da Academia. Certa Vez, Gilberto Jannuzzi, professor livre-docente em sistemas energéticos da Unicamp, me disse que os estudos da Empresa de Pesquisa Energética (EPE) são tão obscuros que às vezes nem ele consegue entender.
O que se quer, mais que interromper Belo Monte, é iniciar um processo de diálogo com atores da sociedade e do governo e entender por que algumas recomendações técnicas são solenemente ignoradas enquanto outras são blindadas de participação.

Quando o sujeito vira pra você e fala “nenhum índio será atingido”, ele está se escondendo atrás das diferentes interpretações que apalavra “atingido” pode denotar. Aperte a tecla SAP do seu televisor e leia o seguinte: é que nenhum índio será afogado (como disse Celio Bermann em entrevista recente) pela cheia do reservatório e não haverá obras dentro da terra indígena. Mas isso está longe de significar uma boa noite de sono para os povos do Xingu.Como aponta um painel de 40 cientistas independentes, não se pode garantir que a mobilidade dos índios não será afetada pela diminuição da vazão do rio e nem que o suprimento de peixes continuará como dantes. Se os índios tiverem reduzida sua principal fonte de proteína e ficarem isolados em algum período do ano, a terra ancestral se tornará imprestável, mesmo sem obras ou inundação. Isso sem falar na dor de cabeça com o previsível aumento das invasões.

Desconfie de quem defende que Belo Monte é uma grande oportunidade de desenvolvimento local. Oportunidade é potência, não é realidade. Poderia melhorar a vida das pessoas? Poderia, sim. É uma montanha de dinheiro que começa a circular nos arredores de uma obra gigantesca. Às vezes, a arrecadação municipal dobra ou até triplica. Mas se o hospital modelo só fica pronto depois do pico das obras (como já aconteceu na Amazônia), quando milhares de migrantes já se mandaram para outras fronteiras, se o troço se torna caro e ocioso… de que adianta?Isso requer um planejamento muito bem feito, com medidas que precisam ser adotadas muito antes das obras, coisa que nenhum governo até hoje conseguiu implementar na Amazônia. Não é à toa que a prefeitura de Altamira, antes defensora fervorosa de Belo Monte, hoje pede a interrupção do projeto até que as medidas de compensação mais fundamentais sejam concluídas.A corda, como sempre, arrebenta no lado mais fraco… Seriam os efeitos colaterais relativizáveis de um bem maior, O Desenvolvimento Do País? Você é quem sabe.

Fonte: Planeta Sustentável

terça-feira, 29 de novembro de 2011

Cresce desmatamento na Amazônia

Depois de dois meses em queda, o desmatamento na Amazônia voltou a subir em outubro, de acordo com dado do governo federal.

O sistema Deter, do Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais), que flagra a devastação em tempo real, viu 385 km2 desmatados em outubro em comparação com 253,8 km2 no mês anterior - um aumento de quase 52%. A cifra é a mesma, porém, de outubro do ano passado -- quando o Deter enxergou 388 km2 devastados na região.
Diferentemente dos dois meses anteriores, em que houve queda na taxa, os dados do Deter não foram anunciados à imprensa pela ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente).
O Estado que mais desmatou foi Rondônia, passando o tradicional campeão Pará, e o município que mais registrou derrubadas foi Porto Velho, onde se constroem as usinas hidrelétricas de Santo Antônio e Jirau, no rio Madeira.
Fonte: Folha on-line, 29 nov 2011

Infelizmente, não há novidade na notícia. Com o novo código florestal em vias de aprovação, os destruidores da floresta já se sentem contemplados e podem agir com mais desenvoltura. Afinal, sabem que mais cedo ou mais tarde, serão anistiados. À exploraçáo ilegal para colher madeira de lei se segue o avanço impiedoso do capim para o gado e da soja. Atrás deles, imensos campos de terra erodida, abandonada. Esta é a triste situação da Amazônia....

quinta-feira, 24 de novembro de 2011

CAMARÕES E CÓDIGO FLORESTAL

A Comissão de Meio Ambiente concluiu na tarde desta quinta-feira (24) a votação do projeto que reforma o Código Florestal. O projeto agora vai a plenário. O texto principal havia sido aprovado na quarta-feira e restavam destaques para votação na comissão. Uma das principais polêmicas do código, a criação de camarões em mangue, foi reaberta no encerramento da votação. Por pressão de parlamentares do Nordeste, os relatores do código, Jorge Viana (PT-AC) e Luiz Henrique (PMDB-SC), se comprometeram a apresentar na votação do código no plenário uma emenda decretando a aquicultura como atividade de "interesse social". Isso poderá permitir que a carcinicultura continue ocupando os chamados apicuns, áreas alagáveis dos manguezais.

Ontem, os senadores José Agripino (DEM-RN) e Eunício Oliveira (PMDB-CE) entraram na sessão de votação do código na Comissão de Meio Ambiente para exigir que a criação de camarão fosse liberada, aprovando uma emenda do senador que retirava apicuns e salgados (outra subdivisão do manguezal) da categoria de Area de preservação permanente No governo, a avaliação é de que, caso seja aprovada, a emenda pode ser vetada pela presidente Dilma Rousseff.
Fonte: Folha on-line.

Mais uma vez, o poder econômico faz valer sua pressão. É sabido que a cultura de camarão, tal como é realizada no Brasil, sobretudo no Nordeste, aniquila com o ecossistema das áreas ocupadas. Considerar tal atividade como “de interesse social” é no mínimo um grande cinismo. Além disso, os manguezais são áreas preciosas para a cadeia alimentar de rios e mares. Permitir que sejam destinados para criação de camarão em cativeiro é comprometer o futuro da vida nos rios e mares. Onde está a consciência dos nossos políticos?

domingo, 6 de novembro de 2011

IDH e ameaças ambientais

As ameaças ambientais podem comprometer avanços no desenvolvimento humano nos próximos anos, e os principais prejudicados serão os países mais pobres do mundo. O alerta é do Pnud (Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento), que divulgou o relatório Sustentabilidade e Equidade: Um Futuro Melhor para Todos.
De acordo com o Pnud, os avanços em saúde e renda, que, junto com educação, compõem o IDH (Índice de Desenvolvimento Humano), poderão ser ameaçados pelas consequências das mudanças climáticas e da destruição ambiental. "Os resultados alcançados nas últimas décadas poderão ser revertidos se não levarmos em conta o desenvolvimento sustentável, compreender que a desigualdade afeta a degradação ambiental e vice-versa", apontou o pesquisador do Relatório de Desenvolvimento 2011, Alan Fuchs.

Pelas projeções do Pnud, se o ritmo de evolução do IDH dos últimos 40 anos for mantido, em 2050 a grande maioria dos países terá índices considerados muito elevados. No entanto, essa trajetória pode ser comprometida pelos riscos ambientais, que foram divididos pelo Pnud em dois cenários: desafio e desastre ambiental.
Até 2050, sem os novos desafios ambientais, o IDH global seria 19% maior que o atual, com melhora principalmente nos índices de países em desenvolvimento. No cenário de desafio ambiental, que considera a poluição do ar e da água e os impactos das mudanças climáticas sobre a agricultura, o IDH global em 2050 seria 8% menor do que no cenário-base. Na hipótese de desastre ambiental, o IDH global seria 15% menor que o projetado para 2050 no cenário básico.

"Sob um cenário de desastre ambiental, a maior parte dos ganhos do início do século será perdida até 2050, com os sistemas biofísicos e humanos sujeitos à pressão do uso excessivo de combustíveis fósseis, da queda dos lençóis freáticos, da desflorestação e degradação da terra, dos declínios dramáticos da biodiversidade, da maior frequência de eventos climáticos extremos", lista o relatório. Os impactos serão maiores nos países do Sul da Ásia e da África Subsaariana, mais vulneráveis, por exemplo, aos impactos das mudanças climáticas, tais como a alteração na ocorrência de chuvas e elevação do nível do mar.
O Pnud sugere mudanças significativas na implementação de políticas públicas e investimentos em sustentabilidade para reverter a situação. "É preciso haver uma mudança macro. Um ambiente limpo e seguro deve ser um direito e não um privilégio", avaliou Fuchs.

Entre as medidas, os autores do relatório defendem a criação de um imposto verde, para taxar as grandes transações financeiras internacionais e financiar o enfrentamento das mudanças climáticas e da pobreza extrema. Segundo cálculos do Pnud, uma taxa de 0,005% sobre as negociações cambiais poderia gerar anualmente US$ 40 bilhões para essas causas.

Fonte: Folha on-line, 3 nov 2011.

sábado, 29 de outubro de 2011

Rede de Esgoto nos municípios brasileiros

Pesquisa divulgada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) mostra que quase metade (44,8%) dos municípios brasileiros não tinha rede coletora de esgoto em 2008.

As diferenças regionais, porém, são grandes: enquanto no Estado de São Paulo apenas Itapura estava nessa situação, na região Norte as cidades sem o serviço chegavam a 96,5% do total.
Os dados consideram apenas a existência ou não da rede coletora, e não a abrangência de cobertura dentro de cada município --ou seja, mesmo que vários bairros de uma cidade não sejam atendidos pelo serviço, ela pode figurar na lista se a coleta for feita em parte de seu território.
Além disso, a pesquisa mostra que a coleta não é acompanhada na mesma proporção pelo tratamento do esgoto. Do total coletado, apenas 68,8% passa por estações de tratamento antes de ser descartado.
Nesse quesito, mais uma vez, é possível notar grandes diferenças regionais. Em São Paulo, 78,4% dos municípios processam ao menos parte do esgoto gerado. No Maranhão, esse percentual cai para apenas 1,4%.
Em parte dos municípios do país que não têm rede de esgoto, porém, é possível encontrar soluções alternativas, como a fossa séptica (dispositivo do tipo câmara que é isolado do solo e faz a filtragem do dejeto). É o caso, por exemplo, de vários municípios gaúchos.
Além disso, os dados mostram uma melhora em relação à pesquisa anterior, de 2000. Naquele ano, a parcela de municípios sem rede coletora de esgoto era de 47,8%.
(Fonte: Folha de São Paulo)

quarta-feira, 21 de setembro de 2011

Dia mundial sem carro

O presidente da ONG Rodas da Paz, Uirá Felipe Lourenço, concedeu entrevista à IHU On-Line, que divulgamos aqui.


Em que contexto surgiu o Dia Mundial sem Carro e de que forma este momento pode contribuir para uma sociedade mais sustentável?
Uirá: A data surgiu na França em 1998, espalhou-se pela Europa e chegou ao Brasil. Atualmente muitas cidades brasileiras promovem ações. A data é uma oportunidade de repensar o modelo de cidade que temos, com excessiva frota motorizada em circulação.

Que problemas o Dia Mundial sem Carro ajuda a minimizar?
Uirá – A proposta do Dia Mundial sem Carro alerta para os diversos malefícios que a excessiva dependência do automóvel nas cidades causa: acidentes e mortes no trânsito, congestionamento, poluição, barulho, estresse e mau uso do espaço público.

De que maneira esta data pode ajudar a sociedade a repensar a cidade?
Uirá – As várias ações propostas servem para que a população reflita sobre o transporte nas cidades. O Desafio Intermodal, por exemplo, testa as diversas modalidades de transporte quanto a tempo, custo, poluição e segurança. As bicicletas costumam se destacar e chegar em primeiro lugar. Mesmo em Brasília, com o contexto altamente favorável ao automóvel, nas três edições do Desafio Intermodal realizadas, a bicicleta se destacou em todos os quesitos, inclusive tempo.
Outra ação interessante, geralmente realizada na semana em que se comemora o Dia Mundial sem Carro, é a Vaga Viva. No espaço tradicionalmente ocupado por carros (vagas de estacionamento) promovem-se atividades de lazer, esportivas e culturais. Por exemplo, deixam-se livros e poltronas para que a pessoa possa se sentar e ler. Um espaço morto, em que o motorista deixa o carro o dia inteiro parado (área sem utilidade pública), ganha vida e utilidade para a população.

Por que a cidade “tem um contexto urbano que não favorece pedestres e ciclistas”?
Uirá – As cidades brasileiras, de forma geral, ainda permanecem com a lógica atrasada de incentivar o transporte individual motorizado. Túneis, viadutos e ampliações de vias ainda fazem parte dos planos e das obras governamentais. Cidades modernas já não fazem isso há décadas. A ordem do dia nas cidades efetivamente modernas é investir em transporte coletivo e no transporte não motorizado. Assim, tais cidades investem em corredores exclusivos de ônibus, em integração, em moderação de tráfego (por exemplo, reduz-se o limite de velocidade na via para permitir melhor convivência entre motorizados e não motorizados), em ciclovias, ciclofaixas e calçadas contínuas e de boa qualidade.
Como exemplo da política atrasada, na nossa capital federal, o estacionamento de carros em área pública é gratuito, um grande incentivo a se permanecer com a alta dependência do carro. Ao mesmo tempo, inexistem vagas públicas para bicicletas. Existem projetos para aumentar ainda mais as vagas para carros, inclusive com estacionamentos subterrâneos, e para ampliar mais vias. E o transporte coletivo continua sofrível: caro, desintegrado, superlotado, sem pontualidade e nem informações básicas aos usuários sobre linhas e horários.

De que forma a data pode auxiliar as autoridades a repensar as capitais e o meio ambiente?
Uirá – Por meio de seminários e de várias ações, as autoridades e técnicos que lidam com o tema mobilidade urbana também são convidados a repensar sobre o modelo ultrapasso de cidade em termos de mobilidade.

O senhor acredita que o grande problema não está no carro isoladamente, mas na “cultura do carro”, que se instalou na sociedade contemporânea? Por quê?
Uirá – O carro em si não é culpado. Países ricos e com alta motorização, como Holanda e Dinamarca, conseguem ser exemplo em mobilidade urbana. Lá, a população tem carro, mas não o utiliza de forma abusiva, no dia a dia. As pessoas pedalam e caminham muito, além de contar com um ótimo sistema de transporte coletivo. Aqui a cultura é de se priorizar o carro, incentivar o uso. Até mesmo pelo status que um carro novo e potente ainda representa.

Quais seriam as estratégias para diminuir o número cada vez maior de carros nas ruas?
Uirá – Oferecer boas condições para os usuários do transporte coletivo, com um sistema eficiente e integrado, e dar segurança e conforto aos que optam por pedalar e caminhar. Num momento posterior, pensar em restrições ao automóvel, como taxar ou proibir a circulação de carros na área central.

Que implicações ambientais, sociais, de saúde e urbanos o número de carros cada vez maior nas ruas pode trazer?
Uirá – Mortes e feridos no trânsito (o Brasil tem níveis epidêmicos, são cerca de 40 mil mortes por ano no trânsito), desigualdade no uso do espaço urbano (a minoria usuária de carro conta com a maior parte do espaço na via), isolamento social (o carro isola as pessoas no seu interior), fator adicional de obesidade, congestionamentos e perda de produtividade, estresse e barulho.

O Dia Mundial sem Carro é um momento que alerta para a mudança dos hábitos diários da população. Mas, de que maneira a data pode significar uma real mudança cotidiana, e não apenas em alguns dias do ano?
Uirá – A ideia é refletir sobre a cidade e demonstrar boas iniciativas. É fundamental que a partir da reflexão promovida na data se apliquem ações em favor da mobilidade saudável.

Que ações o governo pode tomar para oferecer outras saídas viáveis de locomoção e bem estar à população, para que estas dependam menos dos carros para se locomover?
Uirá – Medidas simples como reduzir o limite de velocidade nas vias, criar calçadas contínuas e caminhos seguros aos ciclistas. Criar vagas de estacionamento seguros e confortáveis para usuários de bicicleta.

Como vê a relação carros/ciclistas no trânsito das cidades?
Uirá – Infelizmente, os motoristas não têm boa formação e, muitas vezes, desconhecem ou ignoram os dispositivos do código de trânsito que protegem ciclistas e pedestres. Por exemplo, a distância lateral de um metro e meio ao passar por um ciclista e a preferência que o ciclista tem na via. E por parte do poder público faltam campanhas educativas e de fiscalização que garantam a segurança do ciclista. Mesmo assim, é possível pedalar nas cidades, tomando-se as devidas precauções e escolhendo-se os caminhos mais tranquilos.

quarta-feira, 7 de setembro de 2011

8 Rs da sustentabilidade

O Instituto Akatu foi além dos 3 Rs que resumem o consumo consciente: Reduzir, Reutilizar, Reciclar criando mais cinco. O Ecologia e Fé compartilha os 8 Rs publicados no site do Akatu:
1 - Refletir: Lembre-se de que qualquer ato de consumo causa impactos do consumo no planeta. Procure potencializar os impactos positivos e minimizar os negativos.
2- Reduzir: Exagere no carinho e no amor, mas evite desperdícios de produtos, serviços, água e energia.
3- Reutilizar: Use até o fim, não compre novo por impulso. Invente, inove, use de outra maneira. Talvez vire brinquedo, talvez um enfeite, talvez um adereço.
4 - Reciclar: Mais de 800 mil famílias vivem da reciclagem hoje no Brasil, quer fazer o bem? Separe em casa o lixo sujo do limpo. Só descarte na coleta comum o sujo. Entregue o limpo na reciclagem ou para o catador.
5 - Respeitar: A si mesmo, o seu trabalho, as pessoas e o meio ambiente. As palavras mágicas sempre funcionam: “por favor” e “obrigado”.
6 - Reparar: Quebrou? Conserte. Brigou? Peça desculpas e também desculpe.
7 - Responsabilizar-se: Por você, pelos impactos bons e ruins de seus atos, pelas pessoas, por sua cidade.
8 - Repassar: As informações que você tiver e que ajudam na prática do consumo consciente. Retuite, reenvie e-mails.
O Ecologia e Fé está cumprindo o oitavo "erre", repassando estas dicas.
Faça o mesmo.

sexta-feira, 26 de agosto de 2011

Educação socioambiental em tempo de crise planetária

Entrevista do Instituto Humanitas (IHU) com Genebaldo Dias

Vivemos realmente uma crise ambiental em nível mundial?
Genebaldo – A palavra “crise” não se aplica aí. O que temos são reajustamentos ecossistêmicos. Reações esperadas para a neutralização de perturbações. Muitas destas, impostas por nós. Os sinais estão na mídia todos os dias. Ninguém precisa ser PhDeus para perceber.

– Qual a situação do Brasil com relação às mudanças climáticas? Os órgãos públicos nacionais estão fazendo o que lhes cabe para evitar que elas se aprofundem?
Genebaldo – O Brasil está muito bem representado pela Comissão Interministerial. Temos cientistas renomados ali, e as iniciativas brasileiras são inovadoras. Mas ocorre uma defasagem entre o que é necessário fazer e a percepção dos tomadores de decisão nas políticas públicas. Ainda reina uma grande ignorância sobre o assunto. Os temas de segurança climática, segurança alimentar e vulnerabilidade social, por exemplo, todos ligados às mudanças climáticas globais, são ainda desconhecidos pela classe política. Dessa forma, a América do Sul é apresentada como uma das mais vulneráveis! A partir daí, todos os ecossistemas estão sob pressão.

– Em suas obras, o senhor defende o papel da educação ambiental. Como é possível fomentar uma educação que leve em conta a sensibilização e a promoção de uma cultura socioambiental?
Genebaldo – Não vai ser por meio da coleta seletiva, da economia de água e da energia elétrica que sensibilizaremos as pessoas. Vivemos em um mundo pós-ambiental. Há uma nova insensibilidade. Evolou-se o sonho romântico do retorno à natureza intocada. Agora, estamos em outra etapa. Se não demonstrarmos por meio de práticas as consequências das nossas ações, e se não incluirmos agendas positivas nisso, não vejo saída diferente do sofrimento (que é também uma opção evolucionária!).

– Algumas leituras de mundo religiosas levaram a um certo antropomorfismo. O que é necessário para desconstruir essa ideia, em termos ecológicos?
Genebaldo – Quando nos disseram que vivemos confinados na superfície de uma pequena esfera flutuando no espaço escuro e gelado do universo? Os mistérios da vida, o fascínio de estar vivo, de partilhar precisam ser despertos. Uma educação que sensibilize, amplie a percepção para isso.

– O senhor também fala de “socioambientalismo”. Como conciliar as urgências da natureza com as urgências das populações em risco?
Genebaldo – Nos padrões vigentes não há conciliação possível. A equação não fecha: população crescente, consumo crescente, imediatismo, materialismo, ganância, desperdício, exclusão social, corrupção e educação e informação alienadoras formam um conjunto cruel de insustentabilidades. O desafio é que não temos mais tempo. Perdemos o momento da virada. Agora temos que arcar com as consequências. Isso significa dizer mitigação e adaptação. Foi o que fizemos. O que existe de tentativas – como gestão ambiental e seus ramos – foram e são sistematicamente burlados. Há sempre um grupo de parlamentares financiados por corporações para aprovar leis ambientais mais brandas, por exemplo. O desafio, então, é emblematicamente evolucionário.

– Dentro da perspectiva do “Tempo para a Criação”, como podemos entender o valor da Criação a partir de uma perspectiva mais ampla, ou, como o senhor sugere, “ecoperceptiva”?
Genebaldo – As corporações reconhecem o valor da Criação com a mesma intensidade com que tratam Papai Noel. O novo criador é o dólar e o euro. A catedral, o consumo. A mídia e a educação completam a rede. Alimentam a neoinsensibilidade, o “dane-se” a tudo e a todos. A sensação de “independência”. Por essa razão, estimulamos em nossas práticas a percepção dessa situação. Até mesmo como tentativas. Não sabemos se vai dar certo.

– Quais seriam as possíveis alternativas para um estilo de vida menos impactante e mais harmonioso com a natureza? Por onde começar?
Genebaldo – Não é fácil. Poucas pessoas podem ou querem abrir mão de alguma coisa. Você deixaria de comer carne (cadáver) pelo simples fato de contribuir para a redução do desmatamento, das queimadas, da perda de biodiversidade, da emissão de gases que aumentam o efeito estufa e mudam o clima? Deixaria do comer carne por questões éticas causadas pela crueldade no tratamento do gado? É fácil economizar água, energia elétrica, colocar a latinha para reciclar, essas coisas. Isso não mexe com o seu conforto, suas vontades. Mas uma decisão mais profunda mexe. Aí você não está mais disposto e rotula essa ação de ecorradicalismo, ecochatice, coisa de bicho-grilo, natureba, biodesagradável e por aí segue. Ninguém abre mão. Nem o país rico, de emitir CO2; nem o país pobre, de queimar e desmatar; e nem você, de mudar hábitos alimentares. É uma questão de escala apenas. Eis o desafio, o fascínio e o privilégio de estar presente em um momento fantástico de transição civilizatória. Ou não seria assim mesmo o caminho?

domingo, 14 de agosto de 2011

Ruralistas de olho nas Unidades de conservação

Com 758 mil quilômetros quadrados de área e uma conta de indenizações devidas estimada em R$ 20 bilhões, as Unidades de Conservação (UCs) são o mais recente objeto de disputa entre ambientalistas e defensores do agronegócio. Essa disputa, que promete repetir a polêmica da reforma do Código Florestal, nem esperou a votação das novas regras de proteção do meio ambiente terminar no Senado.

A extensão das áreas protegidas corresponde a três vezes o tamanho do Estado de São Paulo - é também 40% maior que a França. Segundo o Instituto Chico Mendes, órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente responsável pelas áreas, há 310 Unidades de Conservação federais, concentradas sobretudo na Amazônia, onde as unidades fazem parte da estratégia de conter o avanço do desmatamento.
Embora a maior parte das UCs (86%) esteja localizada em terras públicas, isso não significa que a União esteja isenta de pagar indenizações a eventuais ocupantes, assim como aos proprietários de áreas que tenham sido desapropriadas. Daí o tamanho do passivo.
O próprio instituto calcula que as indenizações não pagas alcancem a cifra de R$ 20 bilhões. O valor equivale a quase um ano e meio de pagamento do benefício do Bolsa Família ou três vezes o custo da obra de transposição do Rio São Francisco, a maior obra do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) bancada com o dinheiro dos tributos.

A nova disputa política mostrou os primeiros contornos durante a semana em audiência pública na Câmara. O deputado Moreira Mendes (PPS-RO), presidente da frente parlamentar da agropecuária, anunciou uma "grande campanha" para impedir que novas Unidades de Conservação sejam criadas sem a prévia autorização do Congresso Nacional. Hoje, a criação é feita por meio de decreto presidencial.
Os argumentos são semelhantes aos usados na votação do Código Florestal na Câmara, quando o governo foi derrotado na estratégia de manter as áreas de proteção permanentes às margens de rios e encostas e o conceito de reserva legal nas propriedades. "Daqui a pouco, do jeito que está, não sobra nada para a produção", reclamou Moreira Mendes, que convocou autoridades da área ambiental do governo à Comissão de Agricultura. O colega Valdir Colatto (PMDB-SC) fez coro: "Daqui a pouco, o Brasil vira um parque."
"O argumento de que as unidades de conservação representam um impedimento ao desenvolvimento da agricultura é uma balela. A conservação é importante para garantir a sustentabilidade da atividade econômica", reagiu Bráulio Dias, secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, presente à audiência.
(Reportagem de Marta Salomon - O Estado de S. Paulo, 14-08-2011)

Comentário: Mais uma iniciativa insana contra a sustentabilidade, com o objetivo único de aumentar o lucro imediato dos que se consideram os donos das terras e da Terra.





segunda-feira, 8 de agosto de 2011

Tarefas ecológicas das Religiões

Apresentamos aqui a última parte do artigo de Marcial Maçaneiro, que aponta mais quatro tarefas das religiões a respeito da ecologia. As três primeiras já foram publicadas anteriormente neste blog.

4. Promover a ética ecológica pessoal, comunitária e global

As religiões (de cunho profético, místico ou sapiencial), chaves hermenêuticas sobre o mundo e a condição humana, constroem sentido existencial, inserem o ser humano no cosmo, propõem valores. Antes da emancipação histórica da ética, do direito e das artes, as religiões se ocupavam (como em parte ainda se ocupam) das esferas moral, jurídica e estética. Hoje, a sociedade setorizou-se e o sujeito é nutrido por várias fontes, professando ou não um determinado credo. Contudo as religiões não podem renunciar à sua responsabilidade pela vida, pelo mundo — que perdura, se aprimora e é convidada a reler-se no curso da história.
Vários autores e líderes acreditam que as religiões podem ser parceiras valiosas na promoção de uma ética ecológica, de nível triplo: pessoal, comunitária e global.

5. Dialogar em conjunto sobre questões ecológicas
Edgar Morin preconiza a tolerância proativa, cultural, consciente. Afirma que educar para tal é missão de toda pessoa humana e de toda instituição que se crê legítima. O mesmo lemos em L. Boff, M. Barros, M. Amaladoss, R. Panikkar, F. Teixeira,
Dalai Lama, João Paulo II e outros líderes. As religiões formam um cenário auspicioso para o diálogo entre ecologia da natureza e ecologia do ser humano: seu patrimônio místico, seus valores, sua força de convocação, com núcleos distribuídos nas cidades, países e continentes, possibilitam avançar em tal sentido. Aos poucos, vemos surgir fóruns, ONGs, cátedras, institutos e outros organismos, locais e internacionais, em que a ecologia é assunto da pauta interreligiosa.

6. Atuar em conjunto em causas ecológicas
Agir é o desdobramento consequente do diálogo proposto acima. Mas há também casos emergenciais, em que o agir antecede o diálogo (situações críticas, estratégias humanitárias, encontros espontâneos, ações solidárias em caso de calamidades, guerras ou exclusão). Muitos dos autores citados acima alertam para a possibilidade (aliás, feliz) de as religiões atuarem mais conjuntamente em benefício da justiça, da paz e da ecologia.

7. Reencantar a natureza
Re-encantar a natureza não significa simplesmente remitologizar o mundo. Isso seria atraente do ponto de vista psicológico-afetivo, mas poderia resvalar numa postura ingênua e pouco incidente diante dos fatores políticos, econômicos, técnicos e gerenciais que tocam à ecologia. O “re-encantamento” da natureza é proposto, não com base numa leitura anacrônica das mitologias, mas com base nos conteúdos e valores milenares delas — arquetípicos, centrais e duradouros —, capazes de educar comportamentos sustentáveis. Em termos simples, trata-se de fazer uma leitura oportuna das mitologias, símbolos e ritos referentes à condição humana na Terra, otimizando seu potencial hermenêutico (leitura do valor) e pedagógico (educador de atitudes).
Alguns autores têm oferecido elementos significativos para tal. L. Boff se concentra na sacralidade da vida — fonte de um re-encantamento conexional, cultural e ético da natureza. Outros, como Orlando Figueiredo, teórico português, propõem o paradigma de Gaia: a Terra, segundo ele, é organismo vivo, auto-organizante, que tem sido ferido, entristecido, desrespeitado, com efeitos arriscados à existência humana. Segundo esse autor, conceber a Terra como Gaia ajudaria a superar o dualismo funcionalista pessoa/natureza de estilo sujeito/objeto para tratar o planeta como “entidade” que hospeda, nutre e dialoga com a humanidade.
Outros propõem a via da compaixão (Dalai Lama); da valorização das tradições ancestrais, ligadas à identidade das culturas (Reginaldo Prandi); ou ainda, o reencantamento através da dialogicidade profunda entre sujeito e natureza (Thomas Merton e animadores do DIM – Diálogo Interreligioso Monástico). Cremos que, em perspectiva cristã, contribuem para tal a obra de Hildegard de Bingen e Francisco de Assis, entre outros.


quinta-feira, 14 de julho de 2011

Ecologia e Fé na SOTER


De 11 a 14 de julho aconteceu na PUC-Minas o XXIX Congresso da SOTER, Sociedade de Teologia e Ciências da Religião, com o tema “Religião e Educação para a Cidadania”. Contando com a participação de mais de 300 pessoas, entre professores, mestrando e doutorandos e interessados na temática, o evento foi marcado pela boa organização e excelentes palestristas.

Em uma tarde, aconteceu a reunião do Grupo Temático 8, intitulado: “Religião, ecologia e cidadania planetária”, sob a coordenação de Afonso Murad (FAJE) e Pedro Ribeiro de Oliveira (PUC-Minas). Ouvimos e discutimos vários questões relacionadas à esta temática:
*Introdução à temática (Dr. Afonso Murad)
*Consciência planetária como novo paradigma - a propósito do livro de L. Boff: Cuidar da Terra, proteger a vida (Dr. Pedro A. Ribeiro de Oliveira)
*Religião, espaço e cidadania: nexos, contradições e ambiguidades (Doutorando Sérgio Gonçalves de Amorim)
*A Emergência da Consciência Planetária na Igreja Católica Apostólica Romana (Mestrando Luiz Eduardo de Souza Pinto)
*Espaço shekiná: experiência de eco-espiritualidade e educação ambiental (Me. Moema Muricy)
*Pessoa Humana: de Imago Dei ao Homo Consumericus (Me. Claudia Felter Meira)
*A ECO E O EGO, uma análise da crise ecológica e o egoísmo humano (Doutorando Wagner Lima Amaral)
*A Fraternidade como locus teológico e político para uma cidadania universal (Dr. German Calderon Calderón)
*Educar para a cidadania planetária. Requisitos pedagógicos e princípios teológicos (Dr. Afonso Murad).

Contamos com a presença de Leonardo Boff, que participou parcialmente do nosso GT.
A ecologia, enquanto ciência, compromisso ético de cuidado com o planeta e paradigma, oferece enormes oportunidades para a Teologia e as Ciências da Religião. Para pensar e para agir!

domingo, 10 de julho de 2011

Agrotóxicos: riscos por todos os lados

Parte da entrevista a Wanderlei Pignati, doutor em Saúde Pública. Estuda a contaminação das águas e as bacias, além de participar de uma pesquisa no município de Lucas do Rio Verde, no Mato Grosso do Sul, onde há cinco anos houve um grande acidente de contaminação por agrotóxicos. Fonte: Site IHU (Instituto Humanitas da Unisinos)

Quais são as principais consequências do uso de agrotóxicos para as águas, no caso, os rios e suas nascentes, bacias e os lençóis d’água?
A água é um dos componentes ambientais para onde os resíduos de agrotóxicos vão. Com o uso intensivo de agrotóxicos na agricultura brasileira isso vem se agravando. No ano passado, foram usados cerca de um bilhão de litros de agrotóxicos em nosso país, do tipo que se compra em agropecuárias. Não estou falando do agrotóxico diluído. Um litro de herbicida comprado nesses estabelecimentos é diluído em 100 litros de água para fazer a calda e pulverizar. Isso tem um destino, e parte vai para combater aquilo que se costuma chamar de “pragas da lavoura”. São insetos e ervas classificadas como daninhas, como os fungos. Uma parte vai para o solo, outra evapora e vai para o ar. Uma outra condensa e vai para a chuva, e outra ainda vai para o lençol freático. Essa ida dos agrotóxicos para o lençol freático é o que irá deixar resíduos na água potável ou na água dos rios e córregos. Isso terá impactos na saúde dos animais e dos seres humanos.
Esses produtos vão parar nesses componentes ambientais, inclusive nos alimentos. Resíduos de agrotóxicos podem ser encontrados não só na água, mas nos alimentos, na chuva, ar, solo. Quando falo de resíduos de agrotóxicos nos alimentos, refiro-me inclusive ao leite materno.

Fizemos uma pesquisa e constatamos a presença de agrotóxicos no leite materno de mulheres matogrossenses. Na cidade de Lucas do Rio Verde, interior do Mato Grosso, é usada larga quantidade de agrotóxicos nas culturas da soja, milho e algodão. Isso se reflete nos alimentos produzidos e, inclusive, no leite materno. Vários tipos de agrotóxicos se depositam na gordura e muitos, como os clorados, nunca mais saem dela. É o caso do endosulfan. Quando a mulher produz o leite para amamentar seu filho, esse líquido terá agrotóxico em sua composição. Isso porque o leite é composto por 2 a 3% de gordura. Assim, inclusive a própria criança pode ser prejudicada. A análise de resíduos de agrotóxicos no leite materno é, portanto, muito importante. Foi o que fizemos, analisando dez tipos diferentes desses produtos. Todos eles estavam presentes no leite de 62 mulheres dessa cidade. Isso é muito problemático, pois o alimento que deveria ser o mais puro da nossa vida está também contaminado. Espero que sejam tomadas medidas para que isso não continue a ocorrer.

Quais as principais sequelas para a saúde humana, provocadas pelos agrotóxicos?
O grande problema são as intoxicações crônicas, cuja exposição ocorre a baixas doses durante meses e anos. Após um período mais longo de tempo, podem surgir problemas como câncer, descontrole da tireoide e do sistema neurológico, além de diabetes. Surdez, diminuição da acuidade visual e outros distúrbios neurológicos também são frequentes. Quando uma mulher está em seus primeiros três meses de gestação e entra em contato com agrotóxicos, pode ocorrer má formação fetal. Portanto, são várias as consequências para a saúde causadas por esses produtos, desde intoxicações agudas até aquelas de caráter crônico. Saliento que os problemas dependem igualmente do tipo de agrotóxico utilizado.

Como poderia se constituir um movimento social de vigilância sanitária e ambiental que envolvesse não só entidades do governo, mas a sociedade civil de forma organizada e participativa?
A vigilância em torno dos agrotóxicos existe, de certa forma. Ela limita inclusive o registro, a venda e aplicação dos produtos. A lei regulamenta isso. A maioria dos estados tem suas leis próprias quanto a isso. Contudo, grande parte dessas legislações não são cumpridas. Então, a primeira questão é o cumprimento dessas leis, como no que diz respeito à pulverização perto de rios, córregos, e a pulverização aérea, que nós, médicos sanitaristas, lutamos para proibir. Mesmo assim, existe hoje uma legislação do Ministério da Agricultura e Pecuária – MAPA, a Instrução Normativa n. 2, de 2008, que permite pulverizar agrotóxicos de avião a, no mínimo, 500 metros de distância das nascentes de águas, onde moram populações e em que há criação de animais. Isso, na maioria das vezes, não é respeitado, como ocorre no Mato Grosso. As legislações estaduais quanto à pulverização terrestre constam que o limite é de, no mínimo, 250 metros afastados dessas nascentes, de criação de animais e moradia humana. Mesmo assim, não são respeitadas. Planta-se e pulveriza-se até encostado nas residências, sobretudo em comunidades rurais e nas pequenas cidades do Mato Grosso, Mato Grosso do Sul, Goiás, Rio Grande do Sul e no Sul do Paraná. As pulverizações aéreas e terrestres são feitas sem nenhum respeito.

Em segundo lugar, há toda uma discussão a ser feita pela vigilância sanitária nacional e dos estados para tentar proibir os agrotóxicos que já são banidos na União Europeia. Por que estamos consumindo, ainda, o endosulfan, o metamidofós , o 2,4-D e paraquat ? Esses são os produtos mais consumidos no Mato Grosso. São mais de 30 tipos de agrotóxicos bastante consumidos no Brasil que são proibidos na União Europeia. Alguns já têm legislação que irá proibi-los, como o endosulfan, que a partir de julho de 2013 será tirado do mercado. O metamidofós sai de circulação a partir de julho de 2012. Mas e os outros? A Agência Nacional de Vigilância Sanitária – Anvisa está fazendo a revisão de 14 tipos de agrotóxicos, mas não consegue avançar porque os produtores dessas substâncias entraram com uma ação na justiça. Um juiz federal concedeu liminar exigindo que a Anvisa suspendesse a revisão. Veja o absurdo. O processo iniciado em 2008 ficou mais de um ano parado e foi retomado somente agora. Com toda a dificuldade, a Anvisa vem insistindo no processo.

É preciso haver uma consciência dos grandes produtores de que se está proibido lá fora, aqui deve ocorrer o mesmo. Por que continuar a usar agrotóxicos dessa natureza? Por que é mais barato? Ou por que é mais eficiente? Mas qual é o custo em termos de saúde humana, animal e vegetal, do ambiente como um todo? Precisamos pensar na saúde da água, porque o nosso organismo é composto de 70% de água, e se aquela que consumimos estiver contaminada com agrotóxicos, isso irá prejudicar nosso corpo. Então, repito: é preciso respeitar a legislação e proibir no Brasil os agrotóxicos que já são proibidos lá fora. Também é preciso que a população se conscientize e não consuma produtos que têm agrotóxicos no seu desenvolvimento. Todos os anos o Ministério da Saúde coloca no Programa de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos e vê os resultados dos últimos anos. Desde o ano 2000, dos vinte tipos de alimentos analisados, a maioria contém agrotóxicos. Tem que haver uma divulgação mais ampla para a sociedade. A vigilância sanitária só irá funcionar se a população se conscientizar e mobilizar para isso. Há uma campanha nacional contra o uso de agrotóxicos lançada no I Simpósio Brasileiro de Saúde Ambiental, em Belém, em dezembro de 2010, com o apoio da Associação Brasileira de Saúde Coletiva – Abrasco. A iniciativa chama-se Campanha permanente contra os agrotóxicos e pela vida.

Podemos falar em “uso seguro dos agrotóxicos”?
Não. O uso totalmente seguro dos agrotóxicos é impossível. Os agrotóxicos penetram pela mucosa de pele, do olho, da orelha das pessoas, inclusive pela respiração. Se o trabalhador que aplicar esse produto estiver vestido como um astronauta (porque é assim que se parecem os EPIs criados para proteger os trabalhadores da contaminação por esses produtos), ele quase não será atingido ou contaminado. Isso porque a eficiência do filtro químico é de 80 a 90%, e com as moléculas dos novos agrotóxicos essa eficiência diminui mais ainda, pois há algumas delas que penetram no filtro de agrotóxicos da máscara e prejudicarão quem está realizando a aplicação. O efeito pode levar de cinco a dez anos para ser sentido. Pode não haver um impacto imediato. Mas e a segurança do ambiente, como fica? Será colocado EPI nos peixes, bois, cachorros e plantas que não se quer afetar? Não existe, portanto, uso seguro de agrotóxicos. O ambiente será poluído com substâncias cujo objetivo é matar as “pragas” da lavoura mas, com isso, cria-se todo um ônus ambiental.

quinta-feira, 30 de junho de 2011

Cresce o desmate na Amazônia

O total de área desmatada na Amazônia, no último mês de maio de 2011, é de 268 km2, divulgou o Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais). O número mais que dobrou se comparado com o mesmo período de 2010, quando foram registrados 109,6 km2. A destruição da mata local é classificada em categorias que estão divididas de corte raso a floresta degradada em três níveis (leve, moderada e alta).
O levantamento é feito pelo sistema por satélite Deter (Detecção do Desmatamento em Tempo Real), que pertence ao Inpe. Em maio, 32% de toda a Amazônia Legal não pôde ser mapeada devido a nuvens que atrapalham o monitoramento.
Mato Grosso é o Estado mais afetado, com desmate de 93,7 km2. Em seguida vem Rondônia, com 67,9 km2, Pará, com 65,5 km2, e Amazonas, com 29,7 km2. Os Estados onde houve menor ocorrência foram o Maranhão, com 6,5 km2, o Tocantins, com 4,3 km2, e o Acre, com 0,4 km2.
De janeiro a maio de 2011, o Deter já aponta 880,18 km² de área desmatada em toda a Amazônia.
(Fonte: Folha on line, 30/06/11)

domingo, 26 de junho de 2011

Consciência planetária e Ecologia

Estive no VI Congresso de Educadores Agostinianos, num centro de eventos próximo a Belo Horizonte. Animei o grupo temático intitulado "Iluminar a vida: Consciência Planetária e Ecologia", com dois diferentes grupos. Fiquei feliz em poder partilhar conhecimentos e a paixão pela causa da sustentabilidade com outros educadores e gestores da educação. Promovermos em curto período de tempo um  espaço intenso de reflexão, consciência de si, mística e exercício elaborado do olhar.
Espero que os agostianianos e outras instituições confessionais incorporem a temática da sustentabilidade na sua proposta pedagógica e continuem a tomar iniciativas concretas para formar as novas gerações na consciência planetária.  Afonso Murad


terça-feira, 21 de junho de 2011

Assassinos de Irmã Dorothy

O ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes negou pedido de habeas corpus ao fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, condenado pela 2ª Vara do Tribunal do Júri de Belém (PA) à pena de reclusão de 30 anos pelo assassinato da missionária norte-americana Dorothy Stang, ocorrido em 12 de fevereiro de 2005, no município de Anapu, sul do Pará.
No pedido, que ainda será julgado no mérito, a defesa pede a expedição de alvará de soltura para Vitalmiro recorrer em liberdade da condenação.
Para isso, alega excesso de prazo na prisão preventiva do fazendeiro, principalmente se reconhecida a nulidade do julgamento. Ele cumpre pena no CRC (Centro de Recuperação do Coqueiro), em Belém (PA).
Dorothy, 73, foi morta com seis tiros por um pistoleiro quando se dirigia a um assentamento de agricultores em Anapu, no Pará.
Dois fazendeiros --Vitalmiro Bastos de Moura e Regivaldo Pereira Galvão-- foram denunciados como mandantes do crime, que teria sido encomendado por R$ 50 mil, em razão da interferência da missionária nos conflitos entre pequenos agricultores e grandes proprietários de terra.
Conhecido como Bida, Vitalmiro enfrentou três julgamentos na 2ª Vara do Tribunal do Júri de Belém (PA). Na primeira vez, em 2007, recebeu pena de 30 anos --o que, por lei, lhe garantia automaticamente novo julgamento. Este ocorreu em maio de 2008, e o réu foi absolvido, mas o Ministério Público recorreu e, em 2009, o júri foi anulado.
O terceiro julgamento se deu em 12 de abril de 2010 e condenou o fazendeiro à pena de 30 anos de reclusão, em regime inicial fechado.
(Fonte: Folha de São Paulo on-line, 21/6/11)

sábado, 11 de junho de 2011

Carta do Cacique Mutua Sobre Belo Monte

Carta a todos os povos da Terra

O Sol me acordou dançando no meu rosto. Pela manhã, atravessou a palha da oca e brincou com meus olhos sonolentos. O irmão Vento, mensageiro do Grande Espírito, soprou meu nome, fazendo tremer as folhas das plantas lá fora. Eu sou Mutua, cacique da aldeia dos Xavantes. Na nossa língua, Xingu quer dizer água boa, água limpa. É o nome do nosso rio sagrado. Como guiso da serpente, o Vento anunciou perigo. Meu coração pesou como jaca madura, a garganta pediu saliva. Eu ouvi. O Grande Espírito da floresta estava bravo. Xingu banha toda a floresta com a água da vida. Ele traz alegria e sorriso no rosto dos curumins da aldeia. Xingu traz alimento para nossa tribo.

Mas hoje nosso povo está triste. Xingu recebeu sentença de morte. Os caciques dos homens brancos vão matar nosso rio. O lamento do Vento diz que logo vem uma tal de usina para nossa terra. O nome dela é Belo Monte. No vilarejo de Altamira, vão construir a barragem. Vão tirar um monte de terra, mais do que fizeram lá longe, no canal do Panamá.
Enquanto inundam a floresta de um lado, prendem a água de outro. Xingu vai correr mais devagar. A floresta vai secar em volta. Os animais vão morrer. Vai diminuir a desova dos peixes. E se sobrar vida, ficará triste como o índio.

Como uma grande serpente prateada, Xingu desliza pelo Pará e Mato Grosso, refrescando toda a floresta. Xingu vai longe desembocar no Rio Amazonas e alimentar outros povos distantes. Se o rio morre, a gente também morre, os animais, a floresta, a roça, o peixe tudo morre. Aprendi isso com meu pai, o grande cacique Aritana, que me ensinou como fincar o peixe na água, usando a flecha, para servir nosso alimento.

Se Xingu morre, o curumim do futuro dormirá para sempre no passado, levando o canto da sabedoria do nosso povo para o fundo das águas de sangue. Pela manhã, o Vento me levou para a floresta. O Espírito do Vento é apressado, tem de correr mundo, soprar o saber da alma da Natureza nos ouvidos dos outros pajés. Mas o homem branco está surdo e há muito tempo não ouve mais o Vento.

Eu falei com a Floresta, com o Vento, com o Céu e com o Xingu. Entendo a língua da arara, da onça, do macaco, do tamanduá, da anta e do tatu. O Sol, a Lua e a Terra são sagrados para nós. Quando um índio nasce, ele se torna parte da Mãe Natureza. Nossos antepassados, muitos que partiram pela mão do homem branco, são sagrados para o meu povo.

É verdade que, depois que homem branco chegou, o homem vermelho nunca mais foi o mesmo. Ele trouxe o espírito da doença, a gripe que matou nosso povo. E o espírito da ganância que roubou nossas árvores e matou nossos bichos. No passado, já fomos milhões. Hoje, somos somente cinco mil índios à beira do Xingu, não sei por quanto tempo.

Na roça, ainda conseguimos plantar a mandioca, que é nosso principal alimento, junto com o peixe. Com ela, a gente faz o beiju. Conta a história que Mandioca nasceu do corpo branco de uma linda indiazinha, enterrada numa oca, por causa das lágrimas de saudades dos seus pais caídas na terra que a guardava.

O Sol me acordou dançando no meu rosto. E o Vento trouxe o clamor do rio que está bravo. Sou corajoso guerreiro, não temo nada.
Caminharei sobre jacarés, enfrentarei o abraço de morte da jiboia e as garras terríveis da suçuarana. Por cima de todas as coisas pularei, se quiserem me segurar. Os espíritos têm sentimentos e não gostam de muito esperar.
Eu aprendi desde pequeno a falar com o Grande Espírito da floresta. Foi num dia de chuva, quando corria sozinho dentro da mata, e senti cócegas nos pés quando pisei as sementes de castanha do chão. O meu arco e flecha seguiam a caça, enquanto eu mesmo era caçado pelas sombras dos seres mágicos da floresta. O espírito do Gavião Real agora aparece rodopiando com suas grandes asas no céu. Com um grito agudo perguntou: Quem foi o primeiro a ferir o corpo de Xingu? Meu coração apertado como a polpa do pequi não tem coragem de dizer que foi o representante do reino dos homens. O espírito do Gavião Real diz que se a artéria do Xingu for rompida por causa da barragem, a ira do rio se espalhará por toda a terra como sangue e seu cheiro será o da morte.

O Sol me acordou brincando no meu rosto. O dia se abriu e me perguntou da vida do rio. Se matarem o Xingu, todos veremos o alimento virar areia.
A ave de cabeça majestosa me atraiu para a reunião dos espíritos sagrados na floresta. Pisando as folhas velhas do chão com cuidado, pois a terra está grávida, segui a trilha do rio Xingu. Lembrei que, antes, a gente ia para a cidade e no caminho eu só via árvores.

Agora, o madeireiro e o fazendeiro espremeram o índio perto do rio com o cultivo de pastos para boi e plantações mergulhadas no veneno. A terra está estragada. Depois de matar a nossa floresta, nossos animais, sujar nossos rios e derrubar nossas árvores, querem matar Xingu.

O Sol me acordou brincando no meu rosto. E no caminho do rio passei pela Grande Árvore e uma seiva vermelha deslizava pelo seu nódulo. Quem arrancou a pele da nossa mãe? gemeu a velha senhora num sentimento profundo de dor. As palavras faltaram na minha boca. Não tinha como explicar o mal que trarão à terra. “Leve a nossa voz para os quatro cantos do mundo”, clamou O Vento ligeiro soprará até as conchas dos ouvidos amigos ventilou por último, usando a língua antiga, enquanto as folhas no alto se debatiam.
Nosso povo tentou gritar contra os negócios dos homens. Levamos nossa gente para falar com cacique dos brancos. Nossos caciques do Xingu viajaram preocupados e revoltados para Brasília. Eu estava lá, e vi tudo acontecer.

Os caciques caraíbas se escondem. Não querem olhar direto nos nossos olhos. Eles dizem que nos consultaram, mas ninguém foi ouvido.
O homem branco devia saber que nada cresce se não prestar reverência à vida e à natureza. Tudo que acontecer aqui vai voar com o Vento que não tem fronteiras. Recairá um dia em calor e sofrimento para outros povos distantes do mundo.

O tempo da verdade chegou e existe missão em cada estrela que brilha nas ondas do Rio Xingu. Pronta para desvendar seus mistérios, tanto no mundo dos homens como na natureza.

Eu sou o cacique Mutua e esta é minha palavra! Esta é minha dança! E este é o meu canto!
Porta-voz da nossa tradição, vamos nos fortalecer. Casa de Rezas, vamos nos fortalecer. Bicho-Espírito, vamos nos fortalecer. Maracá, vamos nos fortalecer. Vento, vamos nos fortalecer. Terra, vamos nos fortalecer. Rio Xingu! Vamos nos fortalecer!

Leve minha mensagem nas suas ondas para todo o mundo: a terra é fonte de toda vida, mas precisa de todos nós para dar vida e fazer tudo crescer. Quando você avistar um reflexo mais brilhante nas águas de um rio, lago ou mar, é a mensagem de lamento do Xingu clamando por viver".

(O personagem "Cacique Mutua" e o texto foram criados por Mônica Martins. Expressam de forma poética o grito dos povos da floresta, diante da eminente construção de Usina de Belo Monte)

quinta-feira, 26 de maio de 2011

O caminho da insustentabilidade

A Câmara dos Deputado aprovou nesta terça-feira, 24 de abril, o texto final da reforma do Código Florestal com alterações que significaram uma derrota para a causa da sustentabilidade.

Aprovada por 273 votos a 182, a votação levou o PT e o PMDB --principais partidos governistas-- para lados opostos, na votação das emendas. O texto das emendas autoriza os Estados a participarem da regularização ambiental, deixa claro a anistia para os desmates ocorridos até junho de 2008, além de consolidar a manutenção de atividades agrícolas nas APPs (áreas de preservação permanente).
Para alguns analistas, como o editor de Ciência da Folha de Sáo Paulo, Reinaldo José Lopes, a decisão de manter as áreas consolidadas tem lógica. Pois nas regiões Sul e Sudeste do país há plantações de café, uva e demais produtos agrícolas há décadas, ou mesmo séculos, em APPs (Áreas de Proteção Permanente). E nas outras regiões do país, principalmente a Amazônia?

O Novo Código permite grande avanço das monoculturas de exportação em prejuízo das áreas de florestas, aprofundando o modelo primário-exportador, que garante os dólares das reservas internacionais.

Veja alguns itens deste Novo Código Florestal e suas consequências para o meio ambiente:

(1) Em seu artigo 3º (inciso III) o Novo Código estabelece o conceito de “Área Rural Consolidada”, ou seja, todas as áreas ocupadas anteriormente a 22 de julho de 2008. Conforme dispõem os artigos 10, 12 (§ 1º), 34, 35 e 39, atividades agropecuárias existentes dentro desta “área consolidada” poderão manter-se, mesmo se situadas em áreas de preservação permanente. Em bom português: haverá uma anistia ampla e irrestrita a proprietários que desmataram áreas de preservação ambiental até 22 de julho de 2008. Além do mais, tal permissão é um grande estímulo ao desmatamento atual e futuro, dado que será muito difícil fiscalizar se tais áreas foram desmatadas antes ou depois daquela data. Não é por acaso que o desmatamento já tem aumentado fortemente, sendo que o próprio governo já criou um “Gabinete de Gerenciamento de Crise”.
Além do mais, o artigo 35 também reduz de 30 para 15 metros a área de preservação permanente ao lado dos rios de até 10 metros de largura, em tais “áreas consolidadas”.

(2) No artigo 3º (inciso IV) o Novo Código reduz fortemente as áreas de preservação permanente nas margens dos rios, pois passa a considerar como base o leito menor (durante a seca) e não mais o leito maior (durante a cheia). Desta forma, poderão ser exterminadas imensas áreas de preservação, principalmente no caso dos rios da Amazônia. Já o artigo 38 (§ 3º) permite que as propriedades sem reserva legal possam recompô-la com “espécies exóticas”, que podem abranger culturas como a cana-de-açúcar ou eucalipto. Outra possibilidade (prevista no §5º, IV) é o proprietário adquirir e conservar florestas em outro município ou estado, o que é absurdo e dificulta a fiscalização.

(3) No final da votação, ainda foi incluída uma emenda que permite que os estados– que estão fortemente sujeitos à influência dos grandes proprietários rurais - definam como (e se) será feito recuperação das áreas de preservação ambiental em tais "áreas consolidadas".  Basta pensar em Rondônia ou no Mato Grosso, para imaginar os horrores que estas "legislações locais" poderão legitimar.

O texto deve ser encaminhado ao Senado, e posteriormente à sanção da Presidente Dilma, que pode vetar pontos do Novo Código Florestal. Porém, dado que 410 deputados aprovaram o texto base do relatório, este veto pode ser derrubado pelo Congresso. Apenas 63 deputados votaram contra o texto base do projeto do código florestal.

O que vamos fazer, diante disso? Que caminhos nos restam, ao menos para diminuir o estrago?

(Fontes: Folha, Boletim do Comitê da Dívida Brasileira)

terça-feira, 24 de maio de 2011

Um código florestal perverso

Dez ex-ministros do Meio Ambiente se uniram contra o texto da reforma do Código Florestal que deve ser votado pela Câmara. Em carta aberta à presidente Dilma Rousseff e ao Congresso, o grupo diz que a proposta a ser analisada significa um retrocesso na política ambiental brasileira, que foi "pioneira" na criação de leis de conservação e proteção de recursos naturais.

Segundo os ex-ministros, a votação do texto do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) nesta semana é prematura. "Não vemos, portanto, na proposta de mudanças do Código Florestal aprovada pela Comissão Especial da Câmara dos Deputados em junho de 2010, nem nas versões posteriormente circuladas, coerência com nosso processo histórico, marcado por avanços na busca da consolidação do desenvolvimento sustentável. Ao contrário, se aprovada qualquer uma dessas versões, o país agirá na contramão de nossa história e em detrimento de nosso capital natural", dizem os ex-ministros na carta. Assinaram o texto: Marina Silva (PV), Carlos Minc (PT), Sarney Filho (PV), Rubens Ricupero (sem partido), José Carlos Carvalho (sem partido), Fernando Coutinho Jorge (PMDB), Paulo Nogueira Neto (sem partido), Henrique Brandão Cavalcanti (sem partido), Gustavo Krause (DEM), José Goldemberg (PMDB).

O documento traz um pedido de providências para que o texto de Rebelo seja aperfeiçoado. "O código deve ser atualizado para facilitar e viabilizar os necessários esforços de restauração e de uso das florestas, além que de sua conservação." Em entrevista, oito dos dez ex-ministros fizeram duras críticas ao relatório de Rebelo. Na avaliação deles, não há proteção dos pequenos proprietários nem dos agricultores familiares e ainda ocorre a flexibilização da lei para que haja mais desmatamento. "Esse código é perverso. Primeiro quer anistiar aqueles que estão em débito com o ambiente, principalmente os grandes proprietários, que estão conduzindo a negociação se escorando nos pequenos produtores. A questão da pequena propriedade está resolvida. Por outro lado, quer se flexibilizar a legislação para que haja mais desmatamento. Toda a discussão é permeada por essas duas grandes aspirações do agronegócio nocivo, que em detrimento dos direitos da sociedade querem garantir seus direitos individuais."

"Estamos fazendo mais uma lei para não ser cumprida. Por força da pressão de um segmento econômico forte", disse José Carlos Carvalho. Sem aval do Planalto, líderes da base e da oposição fecharam um acordo na semana passada para a votação do texto de Rebelo. Ficou definido que o PMDB apresentaria uma emenda permitindo a manutenção de atividades agrícolas em APPs (áreas de preservação permanente). O texto trará ainda a previsão para que os programas de regularização ambiental sejam feitos por Estados e também pela União. O Planalto não concorda com essa proposta e quer ter a prerrogativa exclusiva de regularizar as APPs por decreto. O governo também não concorda com a isenção da reserva legal para propriedades de até quatro módulos e com a anistia para os desmatadores.

O ex-ministro do Meio Ambiente Carlos Minc disse que a presidente Dilma se comprometeu a vetar a questão das APPs e da isenção dos quatros módulos quando era candidata ao Planalto no ano passado. "Não queremos que passe a motosserra no código, mas queremos mais tempo para entendimentos, para incorporar pontos importantes", comentou. A ex-ministra Marina Silva afirmou que só a expectativa em torno da análise do novo código gerou aumento significativo no desmatamento nos últimos meses: "Se o desmatamento já esta fora de controle só com a expectativa (da votação do texto), quando for aprovada, teremos uma situação de inteiro descontrole."

(Fonte: Folha de São Paulo)

quarta-feira, 18 de maio de 2011

Ecologia e Ecoteologia

O mundo dá muitas voltas, e certas convicções de raiz retornam com novos matizes. A modernidade proclamou com orgulho a submissão da natureza ao ser humano. A filosofia segue o mesmo caminho, ao sustentar a centralidade do homem, com a autonomia da razão científica, filosófica e subjetiva. A sociedade urbano-industrial e o progresso ilimitado pareciam um sonho sem fim. O antropocentrismo é uma tendência irreversível a se consolidar em todo a orbe. Mas algo levou a questionar tal visão: a consciência planetária. Somos filhos da Terra e responsáveis pelo seu futuro. A contínua degradação do ecossistema, a crise da pretensão de totalidade da ciência, a crescente consciência do desenraizamento do ser humano em relação ao mundo natural e outros fatores criam condições favoráveis para a eclosão de vigoroso movimento ecológico no mundo inteiro.

A ecologia pode ser compreendida como ciência, ética e paradigma. As três dimensões se completam. Enquanto ciência, ecologia significa o estudo de como se inter-relacionam todos os seres que constituem a “comunidade de vida” em nosso planeta: os seres abióticos (água, ar, solo e energia do sol), os seres bióticos (microrganismos, plantas e animais) e o ser humano. Nascida da biologia, a ecologia ultrapassou seu campo inicial de conhecimento, ao propor estudar as relações, os contextos, e não somente determinados seres vivos em seu hábitat. Forja-se então a categoria “interdependência”: todos os seres estão em rede e as redes de matéria e energia são constitutivas na teia da vida.

A começar de seu objeto formal e do método, a ecologia postula a colaboração de muitos saberes. Somente se compreendem as relações na esfera da vida do planeta (biosfera) recorrendo simultaneamente a várias ciências, como biologia, física, química, geografia etc.... Fator semelhante acontece quando se estuda a ecologia humana, ao somar abordagens multidisciplinares da psicologia, da sociologia, da geografia humana, da economia, da história etc.
A abordagem científica da ecologia aproxima-se da teoria da complexidade de E. Morin, por reconhecer a incerteza e a incompletude como parte do conhecimento, que se mantém aberto para tecer novos fios e perceber relações ainda não compreendidas. A ecologia se liga também à holografia e a holística, enquanto percebe que em cada ser, biótico ou abiótico, há uma parte do cosmos, e que o todo é maior do que a soma das partes. A ecologia também se tornou um viés que influencia várias ciências teóricas e aplicadas, pois seu interesse se dirige à sustentabilidade, ou seja, a continuidade da vida no presente e no futuro do planeta. Daí surgem, por exemplo, a arquitetura e construção sustentáveis, a engenharia ambiental, o ecodesign na concepção de produtos, a gestão ambiental...

Ecologia, enquanto ética, diz respeito ao despertar da consciência (ecopercepção) e a empreender ações que tenham em vista a sustentabilidade. Inicia-se com a percepção de que a atual forma de o ser humano se relacionar com o ecossistema está equivocada e levará a humanidade e nossa “casa comum” a desastre sem precedentes. As mudanças climáticas fazem perceber, de forma inequívoca, que a atuação irresponsável do ser humano em relação ao ecossistema tem consequências graves e simultâneas, tais como alteração do ciclo das estações, perda da biodiversidade, contaminação (do solo, do ar e da água), perdas econômicas na agricultura, aumento de doenças respiratórias, custos econômicos não contabilizados e externalizados, etc.
A ética ecológica articula, de forma nova, a questão do indivíduo, do grupo, da instituição e das estruturas sociais e econômicas. Ela rejeita a exclusividade de fatores e a oposição entre subjetividade e coletividade. Propugna que a sociedade ecologicamente sustentável é possível quando se somam, de forma interdependente, atitudes individuais, ações familiares e coletivas, gestão institucional, adoção de políticas locais e nacionais, além de acordos internacionais em forma de protocolos vinculantes.
Assim, sustentabilidade postula também novo ethos humano e sociopolítico. Implica mudança de hábitos pessoais e comunitários de consumo e descarte. Interfere no processo de extração, produção, distribuição, consumo, descarte (ou reciclagem) dos bens e nos serviços a eles associados. Compreende por isso o triple botton line: econômico, social e ambiental. Transforma-se numa das grandes causas da humanidade, no presente e no futuro. Exige que o ser humano recubra o olhar de encantamento, percebendo que os outros seres não são “coisas”, que tome consciência de seu impacto sobre o planeta, da “pegada ecológica”, e assuma novas atitudes.

O paradigma ecológico, por sua vez, consiste na crítica e na superação do antropocentrismo moderno. O ser humano pode até se compreender como “centro consciente do universo conhecido”, mas ele nunca está sozinho. A espécie humana é fruto de longuíssimo processo de evolução da matéria. Somos filhos da Terra e parte da Terra. Por isso, a consciência planetária implica ética planetária: é preciso cuidar da Terra. Assim, ciência e ética se fundem, sem perder a especificidade, num modelo de compreensão do ser humano que se percebe como parte do meio ambiente e em contínua relação de interdependência com ele.

Qual a originalidade da ecoteologia, neste contexto? Brevemente:
— Trata-se de reflexão que resgata a unidade da experiência cristã e de sua formulação, apresentando em seu discurso a relação entre criação, história, encarnação, morte e ressurreição de Jesus, e o início da nova criação.
— Reelabora a teologia da criação na perspectiva da interdependência, mostrando que o ser humano, nos relatos bíblicos, é feito por Deus do barro da terra (consciência ecoplanetária), para cuidar do jardim, assim como para servir-se das outras criaturas, exercitando o senhorio como Deus é Senhor. Há relação estreita entre criação e salvação, e todos os seres estão nelas implicados.
— Explicita e fundamenta a ética do cuidado com o mundo, em ligação estreita com a moral social, ampliando sua abrangência.
— Propõe-se a superar a fragmentação das disciplinas teológicas e, na linha da teoria da complexidade, empenha-se no diálogo efetivo com as “ciências da natureza”.
— Estimula a espiritualidade ecológica, que associa no louvor e no serviço todos os seres à obra criadora, redentora e santificadora da Trindade.
— Estabelece teias de mútua aprendizagem com a teologia da libertação (dimensão social da fé), a teologia feminista, a teologia afro-ameríndia e a teologia das religiões.

A ecoteologia, que apenas se delineia no momento, contribui para superar visões equivocadas ou restritivas da relação do ser humano com o ambiente, assim como de sua própria autocompreensão. Ao se rebelar contra o racionalismo moderno e sua sede ilimitada de tudo explicar e esquadrinhar, o ser humano pode resvalar em posturas irracionais. Confunde-se reencantamento com ingenuidade ou espírito mágico. Exemplos palpáveis se encontram nos discursos de certos grupos religiosos sobre o sentido da doença, do mal, da injustiça social e do destino. Contrariamente ao orgulho antropocêntrico, que tudo submete ao ser humano, proliferam as crenças numa infinidade de determinismos cósmicos sobre o devir individual e coletivo. Além disso, a categoria “energia”, retirada da física quântica, seria uma panaceia que tudo justifica, sem nada explicar.
A holística pode servir à construção do cristianismo atualizado, coerente e cheio de vida; boa-nova para homens e mulheres desesperançados em busca de um fio condutor, sedentos por nova forma de enfocar a posição do ser humano em relação ao cosmos. O fato de comungar com nova mentalidade, compartilhada por grupos não cristãos ou pós-cristãos, não implica aceitação incondicional de todos os componentes. Existem na holística “sinais dos tempos” e sementes do Verbo que pedem reconhecimento e valorização. Há que evitar, no entanto, um pretenso neouniversalismo que a tudo dilui e relativiza, esvaziando o conteúdo da proposta de Jesus Cristo, a novidade radical do Evangelho. Diferentemente do panteísmo, que abole as fronteiras entre o humano e o divino, a ecoteologia propõe o panenteísmo. Compreende que todos os seres estão em Deus e para ele se destinam, pois foram criados pelo Pai, por meio da Palavra (o filho), no Espírito. Este sustenta, renova e leva à consumação a criação.

A ecoteologia tem diante de si duplo compromisso programático. O primeiro consiste em reenfocar temas e disciplinas teológicas, considerando a participação de todos os seres no projeto de redenção e a premência do compromisso ético com a “salvaguarda da criação”. O segundo compreende a adoção de novo paradigma, bioantropocêntrico, que influencia a epistemologia teológica e propugna a unidade entre o conhecimento intelectual e o experiencial-místico.
A ecoteologia se encontra em situação semelhante àquela vivida, faz alguns anos, pela teologia da libertação, quando adotou conceitos e categorias novos, e deve testar a pertinência, a legitimidade e a adequação deles. A dessemelhança reside no acento: não somente na práxis transformadora de cunho social, mas na também na postura ética e na mística que animam a existência humana na relação com a biosfera. Enquanto prática libertadora, a ecoteologia e sua vertente ética ampliam a percepção da prática libertadora, estimulando o compromisso socioambiental dos cristãos.

Em suma, a ecoteologia contribui para ressituar o ser humano à luz da fé cristã, no momento atual de crise global, e contribui para consolidar a consciência planetária: somos filhos da Terra e responsáveis por seu futuro.

Fonte: Afonso Murad, in Introdução a Teologia, Loyola, 2011, ed. revista e ampliada, cap.8.

domingo, 1 de maio de 2011

Mais tempo para as florestas

Partilho com você o texto da Marina Silva veiculado hoje, na Folha de São Paulo.

Mais tempo para as florestas

É extremamente preocupante a forma como está sendo conduzido o debate em torno da atualização da principal lei que protege nossas florestas e nossa biodiversidade: o Código Florestal.

O que tem pautado a ação dos que querem modificar a legislação às pressas parece limitar-se ao interesse imediato, que não leva em conta questões estratégicas, quando sabemos que essa discussão diz respeito à vida de todos nós: as florestas prestam um serviço inestimável de proteção, regulação climática e hídrica, essencial para nossa economia e para a produção agrícola e de energia.

As perdas florestais avançam assustadoramente em todo o mundo, inclusive no Brasil. Já perdemos 93% da mata atlântica, quase metade do cerrado e da caatinga e quase 20% da Amazônia. Ao mesmo tempo, temos mais de 60 milhões de hectares de terras agrícolas que foram degradadas e estão abandonadas, como resultado de um modelo agrícola que precisa mudar.

O cerne das mudanças deve ser o de melhorar a proteção das florestas que nos restam, de criar políticas de incentivo que promovam o desenvolvimento do setor agrícola e florestal, gerando emprego e renda em uma escala muito maior.

Deve ser o de discutir os ajustes necessários para que os produtores rurais possam superar os passivos ambientais e para que nossa agricultura dê um salto de qualidade e produtividade, com sustentabilidade. É a nossa riqueza natural que nos permite ser um dos campeões mundiais de produção agrícola.

Não usar com sabedoria esses recursos é matar a galinha dos ovos de ouro. Quando discutimos o destino das florestas, estamos projetando o Brasil que queremos. Estamos definindo o papel que o país terá no mundo, o tipo de economia e qualidade ambiental que teremos.

Por isso, é absurdo opor produtores rurais e ambientalistas, produção agrícola e meio ambiente.

Mas o absurdo existe e considero que é na política que está o nosso maior problema. É na qualidade do debate e na forma como ele está sendo conduzido na Câmara dos Deputados. Eivado de preconceitos e falsas alegações de que quem defende as florestas estaria a serviço de interesses internacionais, ou, pior, de que a preservação implicaria a diminuição da produção de alimentos e que, com isso, haveria aumento de preços.

Isso nos faz lembrar dos momentos que antecederam a abolição da escravatura no país, quando parte dos produtores rurais bradava que sem os escravos o Brasil rural estaria falido e não haveria quem produzisse comida para nossas mesas.

Por isso, proponho que o Executivo assuma o protagonismo dessa discussão, empenhando-se em construir uma proposta bem estruturada, que atenda aos interesses de toda a sociedade, considerando o que dizem os cientistas brasileiros, com o fortalecimento da governança pública e a criação dos incentivos para o cumprimento da legislação ambiental.

Proponho que a presidente Dilma faça um chamamento à classe política e à nação para que, nos próximos meses, discutamos uma política nacional para a gestão sustentável de nossas florestas e de nossos recursos naturais.

Para tanto, poderíamos adiar o prazo de averbação da reserva legal, previsto para 11 de junho, de forma que tenhamos um ambiente menos tensionado para o diálogo.

Cabe ao governo a responsabilidade de colocar o país no caminho da sustentabilidade e impedir o desmonte da legislação ambiental.

Nos últimos 16 anos, atravessamos dois governos com muitas tentativas de mudanças na legislação.

Nesse período, a sociedade impediu que houvesse um retrocesso.

Agora, cabe a uma mulher a tarefa de promover o encontro e a mediação para a superação do impasse, para a construção de um caminho que integre e projete um futuro melhor para todos.

MARINA SILVA, professora de história, foi candidata à Presidência da República pelo PV em 2010, ministra do Meio Ambiente (2003-2008) e senadora pelo Acre (1995-2011). Site: http://www.minhamarina.org.br/.