Quais são suas perspectivas para a Rio+20?
André Trigueiro – Não sabemos ao certo quantos chefes de estado virão. O que é certo é a gravidade da crise econômica na Europa e nos Estados Unidos, que estará no centro das atenções nos países desenvolvidos ano que vem e poderá ser usada como pretexto para não avançarmos de imediato na direção de um modelo mais sustentável de desenvolvimento, o que é um equívoco. Mas organizações do terceiro setor e as associações de empresas comprometidas com a sustentabilidade se movimentam para que a Rio+20 não seja um fiasco completo.
Que retrospectiva histórica pode ser feita desde a Eco-92 sobre os encaminhamentos em relação aos desafios climáticos do planeta?
André Trigueiro – Cobri a Rio-92 e lembro-me bem da novidade que foi aquela Conferência e do que ela representou para o mundo. O Protocolo de Kyoto e o Tratado da Biodiversidade nasceram ali. A expressão “desenvolvimento sustentável” foi popularizada mundo afora a partir da Rio-92. De lá para cá registramos muitas inovações importantes nos setores público e privado em favor do meio ambiente. Enfim, demos um passo importante. Mas o mundo avançou muito menos do que poderia, ou deveria, nessas duas décadas. Há 20 anos saímos da inércia. Mas hoje constatamos com certa perplexidade que a escalada de destruição do planeta não desacelerou como deveria.O que há de novo, de diferente na Rio+20 em relação às outras conferências do clima já realizadas?
André Trigueiro – Importa esclarecer que a Rio+20 não é uma Conferência formal nas Nações Unidas, onde os países devam buscar acordos oficiais sobre os assuntos discutidos. Não haverá, portanto, o estresse e a tensão das negociações do clima e da biodiversidade, para citar apenas dois exemplos de assuntos estratégicos. Alguns diplomatas e políticos entendem que essa forma “descontraída” de promover o debate pode ajudar na busca por acordos informais que, eventualmente, se desdobrem na direção de uma formalidade legal. Mas não há garantias de que isso aconteça. Está previsto também que as ONGs entreguem aos chefes de estado as conclusões dos debates realizados pelo terceiro setor. Isso poderá gerar um fato de pressão positiva na busca por novos comprometimentos. É esperar para ver.Até que ponto essas reuniões ou conferências sobre o clima contribuem para uma real mudança de paradigma em relação ao planeta?
André Trigueiro – Sem esses encontros tudo seria mais difícil. O fato de os resultados até aqui serem relativamente escassos não invalida a iniciativa. O mundo precisa se reconhecer em torno de uma mesma mesa. É assim que se constrói a agenda da mudança.
Como seria uma economia verde no contexto do desenvolvimento sustentável e da erradicação da pobreza?
André Trigueiro – A expressão economia verde não é aceita por alguns segmentos da sociedade que entendem aí uma tentativa de esvaziar o debate sobre inclusão social e erradicação da pobreza no mundo, que estariam melhor acomodados na expressão “desenvolvimento sustentável”. Há certo exagero nisso. Li o documento da ONU sobre economia verde e a questão da pobreza está colocada. Mas é bom estarmos vigilantes em relação a essa polêmica porque, de fato, há aqueles que não percebem a questão da pobreza como inerente a qualquer debate que pretenda discutir um novo modelo de desenvolvimento.
Qual o papel da sociedade civil e das empresas para o sucesso da Rio+20?
André Trigueiro – É cada vez maior. À medida que os governos tendem a se preocupar com a agenda de curto prazo, com os planos de desenvolvimento imediatistas, é preciso buscar fora dos governos o arco de alianças que projetará o rumo dos debates no longo prazo. Governos passam, vem e vão. A sociedade fica. É preciso dar voz e vez aos legítimos representantes do terceiro setor e das empresas.
Como imaginar um cenário com prosperidade sem crescimento econômico?
André Trigueiro – Não é consensual a tese de que o crescimento econômico seja sinônimo de prosperidade coletiva. O próprio termo “crescimento” está sendo questionado por economistas e pensadores. O economistada USP, Ladislau Dowbor , para citar apenas um exemplo, diz que “crescer por crescer é a filosofia da célula cancerosa”. Há quem defenda um modelo de desenvolvimento em que a meta não seja simplesmente “crescer”, mas promover a retirada sustentável dos recursos naturais. Nossa cultura desenvolvimentista (que elegeu o crescimento do PIB como meta) não enxerga os limites do planeta, e isso pode se revelar extremamente ameaçador para a própria espécie humana. Os valores prevalentes da sociedade de consumo são essencialmente predatórios, não respeitam a resiliência do meio ambiente e a melhor tradução disso em uma única palavra é “ecocídio”. É preciso coragem intelectual para pensar de forma diferente, fazer as perguntas certas e não ter medo das respostas.
Fonte: IHU on-line
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