Marcelo
Barros
Comumente,
a sociedade dominante apresenta os Direitos Humanos apenas como campo de
inviolabilidade individual. Nele se destacam os direitos liberais de ir, vir,
comprar e consumir. Nas últimas décadas, quem mais invoca a Declaração dos
Direitos Humanos são os impérios ocidentais. Eles insistem nesses direitos
individuais, mas para tê-los o passaporte necessário é o dinheiro. Nesse tipo
de sociedade, a pessoa só é cidadã se puder ganhar e consumir (..) Mesmo nos
países que eles não invadem, violam a justiça internacional e patrocinam golpes
e financiam os piores partidos políticos, sempre à sombra dos direitos humanos
e até do nome de civilização cristã.
As
antigas civilizações da Ásia, Oceania e África, assim como as comunidades
índias e afrodescendentes da América insistem que os direitos não são apenas
individuais e sim comunitários e coletivos. Também não isolam direitos humanos
do cuidado com a mãe-terra, dos animais e de todos os seres vivos que se tornam
assim, de alguma forma, sujeitos de direitos. É uma outra concepção de direitos
humanos.
É
dever das pessoas de bem, das comunidades e organizações sociais incorporar em
seu trabalho essas concepções contra hegemônicas e alternativas dos Direitos
Humanos. O amor incondicional e solidário nos leva a assumir a responsabilidade
ética pelos mais frágeis e marginalizados por essa sociedade cruel. No entanto,
além de solidarizar-se à luta dos lavradores, índios, negros, mulheres oprimidas
e todas as categorias de alguma forma vítimas da sociedade excludente, essa
solidariedade nos leva a um novo modo de pensar e viver a relação com a Terra,
a água, a natureza, os animais e todo ser vivo. Também, a Terra, as águas, os
animais e as plantas precisam ser cuidados e defendidos. Não podemos tratá-los
como se fossem meras mercadorias. Conosco eles formam uma grande teia de
relação que é como uma comunidade: a comunhão da vida.
Esse
modo de viver e compreender a vida e os direitos humanos faz parte de uma
cultura amorosa que compreende e pratica a Espiritualidade como forma de viver
plenamente humana e humanizadora. As tradições religiosas têm como missão
ajudar as pessoas a aprofundar esse sentido mais profundo da vida.
Infelizmente, ainda há muita gente que confunde Espiritualidade com
Espiritualismo e trata a fé como se se tratasse de um assunto meramente íntimo
da relação livre do fiel com uma divindade. A mística francesa Simone Weil
afirmava: "Eu reconheço quem é de Deus não quando me fala de Deus, mas
pelo seu modo de tratar as outras pessoas”.
Todas
as religiões, de uma forma ou de outra, reconhecem: o divino só pode ser
encontrado realmente no humano. A espiritualidade, religiosa ou não, faz da
defesa dos direitos do ser humano e da natureza um método de intimidade com o
Divino, presente no mundo. No século II, Irineu, pastor da Igreja de Lyon,
ensinava: "Como você poderá divinizar-se se ainda nem se tornou humano?
Antes de tudo, garanta a condição de ser humano e, assim, poderá participar da
glória divina”.
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