Nota da Comissão Pastoral da Terra (CPT)
A Diretoria e a Coordenação Executiva Nacional da Comissão
Pastoral da Terra unem sua voz à de milhares e milhares de indígenas,
quilombolas, pescadores, ribeirinhos, camponeses e camponesas e trabalhadores e
trabalhadoras rurais do Brasil, que expressam sua perplexidade e descrença
diante do atual quadro político-eleitoral do momento. É frequente
ouvir deles que nenhum candidato e nenhuma proposta se identifica com as suas
necessidades e reivindicações
Vem crescendo uma justa revolta diante do
conchavo permanente entre poderosos grupos econômicos privados, nacionais e
estrangeiros, ruralistas, agroindustriais, mineradores, para ocupar e controlar
cargos nas instituições públicas tanto do executivo, quanto do legislativo. Com
isso objetivam influenciar leis e políticas públicas que facilitem a
perpetuação do latifúndio e da grilagem, que retirem os direitos duramente
conquistados pelos povos indígenas, comunidades quilombolas e outras
comunidades tradicionais, e que flexibilizem os direitos trabalhistas, para
garantir o lucro a qualquer custo para os investimentos e empreendimentos
capitalistas.
Isso, que homens e mulheres do campo, das águas e das
florestas percebem, fica claro na análise dos programas de governo dos candidatos
que, em âmbito federal e estadual, disputam com possibilidades de sucesso as
eleições. Todos eles exaltam a eficiência e importância do agronegócio,
enquanto nem sequer reservam uma linha para a necessidade da reforma agrária,
ou aqueles que a ela se referem, a colocam num plano insignificante. O máximo
que os programas pontuam é algum tipo de apoio à agricultura familiar e uma
insinuação à necessidade de uma agricultura agroecológica e saudável.
O resultado previsto, quaisquer sejam os vencedores, será a
confirmação de um modelo de desenvolvimento que ameaça os territórios
indígenas, quilombolas e camponeses, a continuidade da vida nos nossos biomas e
os direitos trabalhistas. Um modelo de desenvolvimento que, no dizer de
Maninha, do Movimento dos Pescadores e Pescadoras, "traz sofrimento para
nossas comunidades".
O próprio financiamento das campanhas eleitorais pelas
grandes empresas é a expressão cabal do conluio capital/política. Qual será o
interesse, por exemplo, das três empresas responsáveis, até o momento, por 65%
do arrecadado pelos três principais candidatos à presidência da república, JBS
(Friboi), Ambev (Cervejaria) e OAS Construtora, se elas estão envolvidas em
denúncias e punições por violações aos direitos trabalhistas de seus funcionários,
inclusive em situações análogas ao trabalho escravo?
Na contramão dos programas das agremiações partidárias,
infelizmente hegemônicas, insistimos sobre a centralidade da Reforma Agrária.
Trata-se de uma Reforma Agrária ressignificada, que vai além da mera
distribuição de terras: é sonho e projeto que brota e floresce com as novas
experiências e articulações dos indígenas e dos quilombolas, que defendem e
retomam seus territórios, com a proposta de economias que defendam o futuro do
Planeta, ameaçado pelo efeito estufa e mudanças climáticas, agroecologias como
visão do mundo, aproveitamento das energias limpas, soberania e segurança
alimentar respeitosas da Vida, moratórias que preservem o que sobra da
Amazônia, Cerrado, Caatinga, Mata Atlântica e Pampas, com suas bacias
hidrográficas e aquíferos destruídos e constantemente agredidos.
Se não houver uma mudança radical no curso destas eleições,
a CPT sente que elas não marcarão nenhum salto qualitativo em relação às
grandes expectativas que o Brasil fez eclodir, com muita esperança, nas
manifestações de junho de 2013 e nas mobilizações indígenas e camponesas deste
último ano. Por isso conclama a todos quantos sentem a urgência de um Brasil
novo, à participação no plebiscito popular a acontecer na semana da pátria, em
vista da convocação de uma Constituinte soberana e independente para a
construção de uma reforma política que abra espaço para organizações populares,
de classe e de territórios. Estas representadas e presentes nas decisões mais
importantes da vida do País, lutarão para que sejam reconhecidos e aceitos a
autonomia e o protagonismo de grupos que resistem à massificação dos métodos do
capital e propõem alternativas a um modelo de desenvolvimento elitista e
falido.
Se a dimensão política é a "maneira de melhor exercer o
maior mandamento do amor" (Papa Francisco, discurso do dia 10 de junho de
2013), cabe-nos, como Comissão Pastoral da Terra, denunciar as viciadas formas
de exercer o poder que alimentam e fortalecem os grupos já poderosos, que agridem
e ameaçam não só os direitos dos mais fracos, mas a própria Constituição
brasileira.
Goiânia, 27 de agosto de 2014. Comissão
Pastoral da Terra
Fonte: www.cptnacional.org.br
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