terça-feira, 22 de novembro de 2016

Papa Francisco no 3° Encontro Mundial dos Movimentos Populares (Parte 1)

Irmãs e irmãos. Neste nosso terceiro Encontro, expressamos a mesma sede, a sede de justiça, o mesmo clamor: terra, teto e trabalho para todos. Agradeço aos delegados, que chegaram das periferias urbanas e rurais, aos representantes do mundo do trabalho que vieram dos cinco continentes, de mais de 60 países, para debater uma vez mais as propostas sobre como defender estes direitos que nos convocam.

Agradeço aos bispos que os acompanham, e também aos milhares de italianos e europeus que se uniram hoje, no encerramento deste Encontro. Agradeço aos observadores e aos jovens comprometidos com a vida pública que vieram com humildade, para escutar e aprender. Quanta esperança tenho nos jovens! Agradeço também a você, senhor cardeal (Peter) Turkson, pelo trabalho feito no Dicastério, e também gostaria de mencionar a importante colaboração do ex-presidente uruguaio José Mujica, que está presente.
Em nosso último encontro, na Bolívia, com maioria de latino-americanos, falamos sobre a necessidade de uma mudança para que a vida seja digna, uma mudança nas estruturas, e também falamos sobre como vocês, os movimentos populares, são os semeadores dessa mudança, promotores de um processo no qual confluem milhões de ações grandes e pequenas encadeadas criativamente, como numa poesia. Por isso, prefiro chamá-los de “poetas sociais”. Também enumeramos algumas tarefas imprescindíveis para marchar no rumo de uma alternativa humana à globalização da indiferença: 1 – fazer com que a economia esteja a serviço das pessoas, 2 – construir a paz e a justiça, 3 – defender a Mãe Terra.

Naquele dia, através das vozes de uma catadora e de um camponês, foram lidas as conclusões, os dez pontos de Santa Cruz de la Sierra, onde a palavra mudança estava cheia de grande conteúdo, enlaçada a elementos fundamentais que vocês reivindicam: trabalho digno para os excluídos do mercado de trabalho, terra para os camponeses e povos originários, moradia para as famílias sem teto, integração urbana para os bairros populares, erradicação da discriminação, da violência contra a mulher e das novas formas de escravidão, o fim de todas as guerras, do crime organizado e da repressão, a defesa da liberdade de expressão e comunicação democráticas, a promoção da ciência e da tecnologia a serviço dos povos.
Escutamos também como se comprometeram a abraçar um projeto de vida que rechaça o consumismo e recupera a solidariedade, o amor entre nós e o respeito à natureza como valores essenciais. É a felicidade de “viver bem” o que vocês demandam, a “vida boa”, e não esse ideal egoísta que enganosamente inverte as palavras e propõe a “boa vida”.

Os que estão aqui hoje, de diferentes origens e possuidores de crenças e ideias diversas, talvez não estarão de acordo em tudo o que foi conversado, pois nossos pensamentos certamente não concordaram em muitas coisas, mas estamos de acordo nos objetivos que buscamos. Soube que os encontros e debates realizados em diferentes países multiplicaram este evento, para que estes debates se reproduzam sob a luz da realidade de cada comunidade.
Isso é muito importante, porque as soluções reais às problemáticas atuais não vão sair de uma, três ou mil conferências: devem ser fruto de um discernimento coletivo que amadureça nos territórios, junto aos irmãos. Um discernimento que se converte em ação transformadora, “segundo os lugares, os tempos e as pessoas”, como diria São Inácio.

Senão, corremos o risco das abstrações, “dos nominalismos declaratórios (slogans) que são belas frases, mas que não servem para sustentar a vida de nossas comunidades” – menção à Carta ao Presidente da Pontifícia Comissão Para a América Latina, de 19 de março de 2016.
O colonialismo ideológico globalizante procura impor receitas supraculturais, que não respeitam a identidade dos povos. Vocês vão por outro caminho, que é, ao mesmo tempo, local e universal. Um caminho que me faz recordar como Jesus pediu para organizar a multidão em grupos de cinquenta para dividir o pão.
Recentemente, pudemos ver o vídeo apresentado na conclusão deste terceiro Encontro. Vemos os rostos de vocês nos debates sobre o que fazer “diante da iniquidade que engendra violência”. Tantas propostas, tanta criatividade, tanta esperança na voz de vocês, que talvez sejam os que mais motivos têm para se queixar, deixar que o conflito nos leve ao derrotismo, cair na tentação do negativo.

Entretanto, vocês olham para frente, pensam, discutem, propõem e atuam. Eu os felicito, os acompanho, e peço que continuem abrindo caminhos e lutando. Isso me dá força, nos dá força. Creio que este nosso diálogo, que agrega o esforço de tantos milhões que trabalham cotidianamente pela justiça no mundo todo, vai consolidando suas raízes.
(Em 5 novembro 2016)

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