quinta-feira, 20 de maio de 2010

Cosmologias em conflito

Leonardo Boff
O prêmio Nobel em economia Joseph Stiglitz disse recentemente:"O legado da crise ecômico-financeira será um grande debate de idéias sobre o futuro da Terra". Concordo plenamente com ele. Vejo que o grande debate será em torno das duas cosmologias presentes e em conflito no cenário da história. Por cosmologia entendemos a visão do mundo - cosmovisão - que subjaz às idéias, às práticas, aos hábitos e aos sonhos de uma sociedade. Cada cultura possui sua respectiva cosmologia. Por ela se procura explicar a origem, a evolução e o propósito do universo e definir o lugar do ser humano dentro dele.

A nossa atual é a cosmologia da conquista, da dominação e da exploração do mundo em vista do progresso e do crescimento ilimitado. Caracteriza-se por ser mecanicista, determinística, atomística e reducionista. Por força desta cosmovisão, criaram-se inegáveis benefícios para a vida humana mas também contradições perversas como o fato de que 20% da população mundial controlar e consumir 80% de todos os recursos naturais, gerando um fosso entre ricos e pobres como jamais havido na história. Metade das grandes florestas foram destruidas, 65% das terras agricultáveis, perdidas, cerca de 5 mil espécies de seres vivos anualmente desaparecidas e mais mil agentes químicos sintéticos, a maioria tóxicos, lançados no solo, no ar e nas águas. Construiram-se armas de destruição em massa, capazes de eliminar toda vida humana. O efeito final é o desequilíbrio do sistema-Terra que se expressa pelo aquecimento global. Com os gases já acumulados, até 2035 fatalmente se chegará a 2 graus Celsius, e se nada for feito, segundo certas previsões, serão no final do século 4 ou 5 graus, o que tornará a vida, assim como a conhecemos hoje, praticamente impossível.

A predominância dos interesses econômicos especialmente especulativos, capazes de reduzirem paises à mais brutal miséria e o consumismo trivializaram nossa percepção do risco sob o qual vivemos e conspiram contra qualquer mudança de rumo. Em contraposição, está comparecendo cada vez mais forte, uma cosmologia alternativa e potencialmente salvadora. Ela já tem mais de um século de elaboração e ganhou sua melhor expressão na Carta da Terra. Deriva-se das ciências do universo, da Terra e da vida. Situa nossa realidade dentro da cosmogênese, aquele imenso processo de evolução que se iniciou a partir do big bang, há cerca de 13,7 bilhões de anos. O universo está continuamente se expandindo, se auto-organizando e se autocriando. Seu estado natural é a evolução e não a estabilidade, a transformação e a adaptabilidade e não a imutabilidade e a permanência. Nele tudo é relação em redes e nada existe fora desta relação. Por isso todos os seres são interdependentes e colaboram entre si para coevoluirem e garantirem o equilíbrio de todos os fatores. Por detrás de todos os seres atua a Energia de fundo que deu origem e anima o universo e faz surgir emergências novas. A mais espetacular delas é a Terra viva e nós humanos como a porção consciente e inteligente dela e com a missão de cuidá-la.

Vivemos tempos de urgência. O conjunto das crises atuais está criando uma espiral de necessidades de mudanças que, não sendo implementadas, nos conduzirão fatalmente ao caos coletivo e que assumidas, nos poderão elevar a um patamar mais alto de civilização. É neste momento que a nova cosmologia se revela inspiradora. Ao invés de dominar a natureza, nos coloca no seio dela em profunda sintonia e sinergia. Ao invés de uma globalização niveladora das diferenças, nos sugere o bioregionalismo que valoriza as diferenças. Este modelo procura construir sociedades autosustentáveis dentro das potencialidades e dos limites das bioregiões, baseadas na ecologia, na cultura local e na participação das populações, respeitando a natureza e buscando o "bem viver" que é a harmonia entre todos e com a mãe Terra. O que caracteriza esta nova cosmologia é o cuidado no lugar da dominação, o reconhecimento do valor intrínseco de cada ser e não sua mera utilização humana, o respeito por toda a vida e os direitos e a dignidade da natureza e não sua exploração.

A força desta cosmologia reside no fato de estar mais de acordo com as reais necessidades humanas e com a lógica do próprio universo. Se optarmos por ela, criar-se-á a oportunidade de uma civilização planetária na qual o cuidado, a cooperação, o amor, o respeito, a alegria e espiritualidade ganharão centralidade. Será a grande virada salvadora que urgentemente precisamos.

2 comentários:

  1. Antônio Marcos, ISTA, Gestão Pastoral13 de outubro de 2010 às 21:26

    Considero um tema muito interessante o trabalhado por Leonardo Boff nesse artigo: o conflito entre duas cosmologias, a da conquista e a do cuidado. Realmente vivemos um tempo em que o capitalismo dita as regras de como ser feliz, os interesses econômicos são colocados acima da vida do ser humano e de todo o universo. E infelizmente, essa cosmologia da conquista consegue manipular as pessoas para que não queiram sair dessa rede. Agora, felizmente, podemos ver a cosmologia do cuidado surgindo, uma espiritualidade integradora, que nos coloca em harmonia com todo o cosmo.
    Sou adepto da idéia de que o universo está continuamente se expandindo, se auto-organizando e se auto-criando. Vivemos numa grande teia onde estamos interligados, todos os seres são interdependentes. E uma última idéia que também comungo: Por detrás de todos os seres atua a Energia de fundo que deu origem e anima o universo e faz surgir emergências novas.
    A cosmologia do cuidado precisa ser espalhada pelo mundo, pois, como disse Boff, pode ser a grande virada salvadora que precisamos.

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  2. Johanna Bretón. Gestão Patoral ISTA


    Cada día más me encuentro al margen de mí misma, y me decubro necesitando de cambio, de integración, de comunión con todo lo que me rodea.

    Este articulo me abre muchas posibilidades para poder ir atrás de esa nueva Cosmología, me despierta nuevos sueños, nuevas esperanzas ante el todo.
    Si me quedo en mí misma me empobreceré, por eso gracias a Dios el universo está a cada instante llamándome a relacionarme con todos los seres. ¡Que riqueza poder experimentar la autocreación y transformación del universo!

    Abro los ojos y contemplo estos tiempos de urgencia, que necesita de cada uno/a esta apertura de estar siempre en cambio, un cambio que nos ayudará a crecer y a dar un paso más. Aveces eso es lo único que necesitamos “un paso más” para compreender que no estamos solos, que podemos ofrecer de nuestra parte el compromiso, respeto y cooperación para con todos los Seres que formamos parte de este universo.

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